Carlos Bernardes, (11-03-1968 – 03-05-2021)
Fiquei triste, quando soube do falecimento de Carlos
Bernardes.
Um dia, em uma ou duas linhas referi-me negativamente à sua
tese de doutoramento, que me pareceu não ser adequada à obtenção de tal grau…
Acrescentei a pergunta, mais ou menos nestes termos: «Mas que necessidade terá
um bom presidente de Câmara de ter um doutoramento?» Foi com mágoa que o fiz,
já então tinha boa impressão dele e continuei a ter, depois.
Senti tensão, para dizer o mínimo, perante a tragédia que
envolveu o seu desaparecimento, que toca a todos, como membros da mesma
comunidade. O texto que transcrevo do «momento de reflexão» de Carlos
Bernardes, em aparente postura de luto premonitório (ver vídeo divulgado por
TORRES VEDRAS ANTIGA), é impressionante.
As palavras que seguem são reproduzidas na sua oralidade, o
que deve perdoar algum aparente erro. Merecem ficar na memória dos torrienses.
Tínhamos Homem…
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(Transcrição do vídeo publicado em 4 de Maio de 2021)
Sempre quero partilhar convosco uma pequena reflexão que…,
daquele homem que está à vossa frente, que tem cinquenta e dois anos, se deus
quiser dia onze de Fevereiro faço cinquenta e três…, nasci na maternidade
Alfredo da Costa, vivi até aos oito anos em Caneças, os meus pais nasceram no
casal das Naculas e no casal Cochim na freguesia da Silveira, são pessoas
honradas… e a honra das pessoas… não podem ser… desta forma. E com oito anos
viemos, vivíamos em Caneças e viemos viver para o Turcifal, onde vivemos até
aos dias de hoje. Foi aí que fez até à minha primeira quarta classe e depois
fiz os meus estudos até ao ensino secundário, onde terminei a minha actividade
enquanto aluno. O meu pai teve uma doença grave em 1987 e vi-me obrigado a ir
trabalhar. E esta pessoa que está na vossa presença, com dezanove anos, era
responsável por um conjunto de actividades profissionais que hoje tenho muito
orgulho de as ter exercido. Por um lado, especializei-me enquanto medidor
orçamentista, e foi aí que comecei a minha carreira na Câmara Municipal de
Torres Vedras, com dezanove anos…, mas também com dezanove anos tive que ir à
procura de ganhar mais dinheiro, para sobreviver e ajudar a minha família e com
essa tenra idade já coordenava transporte internacional entre Lisboa, Málaga,
Torremolinos, onde fui responsável por essa linha durante sete anos no grupo
Euro Lines, onde a empresa Intercentro era uma das associadas para o qual
estava o meu serviço. Nessa minha vida, tive oportunidade, ainda, de, face aos
escassos recursos, ser desenhador na área da electricidade no gabinete do
arquitecto Joaquim Esteves, da nossa cidade, onde aí após o serviço laboral de
sair às cinco da tarde até à meia-noite, uma, duas da manhã, produzia desenho
técnico de electricidade até aos meus vinte e cinco anos. O período em que
trabalhei no grupo Euro Lines, onde, para além de ser responsável pela linha
Lisboa-Torremolinos, transportei milhares e milhares de pessoas, comuniquei com
muita gente, muitos contactos, e comecei a realizar, enquanto homem. E nessa
dimensão, tive oportunidade de no período da minha vida dos dezanove aos vinte
e cinco, entre o mês de Maio e o mês de Outubro, trabalhar ininterruptamente
todos os dias da semana, os sete dias da semana, entre as oito da manhã,
sensivelmente, e a meia-noite. E, portanto, aquilo que é trabalho, aquilo que é
dedicação, aquilo que é abnegação o Carlos Bernardes tem feito isso ao longo da
sua vida. E ao longo da sua vida teve oportunidade de contrair matrimónio e ter
um filho, quando tinha vinte e cinco anos. Portanto, desse ponto de vista, é
assim que a vida vai evoluindo e podermos fazer aquilo que gostamos. E nesse
mesmo percurso tive oportunidade de ser dirigente desportivo, tive oportunidade
de ser autarca de freguesia, autarca dum concelho vizinho, autarca em Torres
Vedras e, com quarenta anos, decidi voltar a estudar. Dos quarenta aos quarenta
e sete fiz a minha licenciatura, fiz o meu doutoramento e sempre depois da hora
do serviço, nunca colocando o serviço em causa, nunca deixando nada para trás.
E, digamos, o percurso de vida continuou e foi com muito gosto que nesta mesma
sala no dia 1 de Dezembro de 2015 que assumi a presidência da Câmara Municipal
de Torres Vedras. Em 2017, fui com a minha equipa eleito presidente da Câmara
Municipal de Torres Vedras. É para mim um enorme orgulho, uma grande abnegação
poder enquanto cidadão ter uma missão pública, de prestar aquilo que nós, do
ponto de vista do ser humano podemos fazer, dar algo ao próximo. E é nessa
dimensão que efectivamente hoje aqui estou a partilhar convosco este momento de
reflexão…
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