"NOVA SINTRA – O PÃO QUE O DIABO AMASSOU
O saudoso Ramiro Neto, destacado na cozinha do nosso
Batalhão, dias antes da partida, disse: - …Meu Capitão Paraiso Pinto, eu tenho
muito medo, não me deixe ir para N.Sintra, tenho um mau pressentimento… -
…Não sei? Vou falar com o Comandante, logo te digo…respondeu-lhe
o Capitão. –
…Então meu Capitão já tem resposta para mim? –
…Tenho! O Comandante não abre excepções. Vão todos. Ninguém
fica para trás…olha que insisti bastante…não consegui demovê-lo!
Aquando da flagelação IN, 7 dias depois de estacionadas as
NT em Nova Sintra, o nosso bravo camarada morreu. Morte originada pelo
estilhaço do rebentamento de uma granada de morteiro. Pensava ele estar
protegido pela tampa da chapa de bidão, que colocou na vala-abrigo construída.
O fragmento entrou pelo único buraco que deixou aberto. Foi a 13 de Maio de
1968.
Quem esteve por lá sabe que, na zona operacional do comando
do Bart 1914, a tabanca de Tite, que ladeava a sul e a norte o aquartelamento
das NT, era (a seguir a Bissássema com dimensão para além do triplo), o maior
agregado populacional desta área, seguindo-se os das regiões de Jabadá e
Fulacunda.
Também é do conhecimento que esta dispersão populacional,
contornada por rios, bolanhas e matas, rica no cultivo orizícola, em pecuária
(bovino) e na suinicultura (suínos), possibilitava, ao IN, grande mobilidade no
desencadear acções de guerrilha, para flagelação aos nossos aquartelamentos,
para controlo demográfico e político-administrativo das populações.
Consequentemente, ainda permitia sacar, das populações, farto abastecimento em
géneros e roupas (panos), e elevado recrutamento de carregadores. Com vistas a
desencadear as já citadas flagelações, com armas pesadas, às nossas posições
aquarteladas na região, nomeadamente em Tite, Enxudé, posto avançado e porto fluvial
de Tite, Jabadá, Fulacunda, Empada e ainda em S. João, destacamento avançado de
Bolama. Assim como na montagem de emboscadas, colocação de minas e armadilhas
com vistas a barrar ou mesmo anular o avanço no território das NT. Toda esta
magnificência operacional do IN, obrigava, no ponto de vista militar, a
implementar um vasto e variado conjunto de operações, que foram em número de
117, até à ocupação do terreno de N. Sintra, visando desobstruir estradas e
caminhos há muito emaranhados por denso matagal, possibilitando fácil acesso
das NT ao patrulhamento, batidas, emboscadas e outras acções de confronto, com
vistas ao enfraquecimento e despejo do IN da região.
Desobstruídas as estradas de terra batida, reparados,
reconstruídos ou mesmo construídos os pontões, permitiu utilizar outros meios,
até aí impossibilitados, nomeadamente os carros de combate – Daimlers – (jeeps
blindados) e de transportes das tropas em viaturas ligeiras e pesadas,
concludentemente a uma mais rápida ligação aos aquartelamentos implantados na
região, proporcionando eficazes controlos territoriais e populacionais, fixar
tropas e materiais de engenharia no terreno, nomeadamente em Nova Sintra,
visando a construção de um novo quartel.
Dos nossos opositores, todas estas acções não podiam ficar
sem resposta. Detentores do território, organizados, bem armados e municiados,
procuravam, energicamente, impedir a progressão das NT, montando, por efeito de
nomadização, várias emboscadas, colocando dezenas de minas no terreno e
granadas accionadas por fio de tropeçar. Destruíram, por várias vezes, os
pontões já implantados, colocavam abatizes armadilhados, obstáculos
constituídos por grossos ramos de árvores, fortemente ligados ao solo com as
extremidades aguçadas, tudo obviamente com vistas ao impedimento da progressão
das NT.
Cumulativamente desencadearam, aos diversos aquartelamentos
e posições agrupadas nas regiões afectas (exemplo Bissássema), 47 flagelações,
com destaque para Fulacunda e Tite, causando às NT, até ao final de Março de
1968, 8 mortos (2 por afogamento) cerca de meia centena de feridos, alguns de
muita gravidade e com necessidade de serem evacuados para o continente, e ainda
3 capturados.
Sabemos que as moedas têm duas faces, as guerras também. Até
ao começo da implementação do quartel em Nova Sintra, – Maio de 1968 – nas
operações, de diverso tipo, desencadeadas pelas companhias aquarteladas em
Tite, Jabada, Fulacunda, Empada, pelo destacamento de S.João e por Companhias
de Pára-quedistas (2 vezes), estima-se que foram mortos 128 guerrilheiros,
feridos, mais do dobro, presos ou capturados 117, dos quais foram soltos por
falta de interesse estratégico/militar 112. Destruído 3 de acampamentos
militares, 12 canoas e capturadas várias toneladas de material de guerra,
pesado e ligeiro, onde se inclui 1 canhão s/recuo.
Nestas fotos estão a imagem do Neto, no cemitério e a outra é da placa de Homenagem que já está pronta mas que por causa do covid ainda não foi possível colocar na campa.
Após 50 anos o Hipólito conseguiu encontrar a campa do nosso amigo no cemitério de Penamacor, concelho de Paços de Ferreira, tendo falado com a familia e conseguido autorização para a colocação da placa. Obrigado ao Pica Sinos e ao Hipólito.
Leandro Guedes.
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