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“Se servistes a Pátria que vos foi ingrata, vós fizestes o que devíeis e ela, o que costuma”


(Do Padre António Vieira, no "Sermão da Terceira Quarta-Feira da Quaresma", na Capela Real, ano 1669. Lembrado pelo ex-furriel milº Patoleia Mendes, dirigido-se aos ex-combatentes da guerra do Ultramar.).

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"Ó gentes do meu Batalhão, agora é que eu percebi, esta amizade que sinto, foi de vós que a recebi…"

(José Justo)

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“Ninguém desce vivo duma cruz!...”

"Amigo é aquele que na guerra, nos defende duma bala com o seu próprio corpo"

António Lobo Antunes, escritor e ex-combatente

referindo-se aos ex-combatentes da guerra do Ultramar

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Eles,
Fizeram guerra sem saber a quem, morreram nela sem saber por quê..., então, por prémio ao menos se lhes dê, justa memória a projectar no além...

Jaime Umbelino, 2002 – in Monumento aos Heróis da Guerra do Ultramar, em Torres Vedras
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“Aos Combatentes que no Entroncamento da vida, encontraram os Caminhos da Pátria”

Frase inscrita no Monumento aos Heróis da Guerra do Ultramar, no Entroncamento.

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Sem fanfarra e sem lenços a acenar, soa a sirene do navio para o regresso à Metrópole. Os que partem não são os mesmos homens de outrora, a guerra tornou-os diferentes…

Pica Sinos, no 30º almoço anual, no Entroncamento, em 2019
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"Tite é uma memória em ruínas, que se vai extinguindo á medida que cada um de nós partir para “outra comissão” e quando isso nos acontecer a todos, seremos, nós e Tite, uma memória que apenas existirá, na melhor das hipóteses, nas páginas da história."

Francisco Silva e Floriano Rodrigues - CCAÇ 2314


Não voltaram todos… com lágrimas que não se veem, com choro que não se ouve… Aqui estamos, em sentido e silenciosos, com Eles, prestando-Lhes a nossa Homenagem.

Ponte de Lima, Monumento aos Heróis da Guerra do Ultramar


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terça-feira, 31 de dezembro de 2019

Sonho duma Noite de Natal... de Aquilino Ribeiro!


Sonho_de_uma_noite_de_Natal« […] Como aquela fosse uma noite muito santa e muito álgida – o Salvador ia nascer nas palhas para lembrar aos homens que vêm do nada e para lá caminham – mãe e filha se deixaram ficar ao lume, tão perto, que a chama do toro de carvalho, reatando-se de pois de sopitar, alumiava mais que a candeia. A Mãe no seu luto de viúva, chaile (sic) roto pelos ombros, mal tinha acabado de espiar a roca e cismava; a pequena, dez anos espertinhos e medrados, com um pauzito ia atiçando o fogo, entretida a ver dançar e rodopiar os mil fogaréus da combustão. De repente, quebrando o devaneio, disse para a mãe:
− Porque é que uns são tão ricos e outros tão pobres?


− Porquê?… Fazes cada pergunta! Olha lá, os dedos da mão são todos iguais?
− Ó mãe isso não quer dizer nada. Os dedos são desiguais, não há dúvida, mas entendem-se todos muito bem uns com os outros. E que tem lá que sejam desiguais se o sangue é o mesmo, pois não é?
A mãe não soube ou não quis contestar e ouviu-se lá fora o tropel da rapaziada que preparava a fogueira do Natal naquela noite tão luminosa que, não obstante a luz da candeia, uma réstia de luar atravessava o telhado de telha vã e vinha bater no frontal como uma lança.
− Sabe, mãe, a Zezinha da Casa Grande chamou-me quando meti o gado. Só queria que vomecê visse as coisas bonitas que lá tem. Uma riqueza! E espera mais, muitas mais, que lhas há-de trazer o Pai Natal. Armaram um pinheiro no meio da sala, com muita velinha, muita velinha e neve a fingir, só para pendurarem as prendas. O Pai Natal vem de Lisboa e Paris, carregado, carregadinho que não pode com mais às costas. É verdade, mãe, que quem o manda é o Menino Jesus?
− É verdade. O Menino Jesus enche-lhe os taleigos e diz-lhe: toca, vai levar…
− Mas ele só vai levar aos ricos? À nossa casa não vem?
− Não querias mais nada?! Ele só anda pelas casas fartas, asseadas… muito branquinhas, e hão-de ter chaminé. Não sei se sabes, ele vem pela chaminé.
−Também me disse a Zezinha que vinha pela chaminé. Por causa disso pôs um sapatinho na pedra do fogão para começar logo por ali. Diz ela que no sapatinho lhe há-de deixar uma prenda que não pode adivinhar o que seja, mas que é a mais bonita e a mais cara de todas. Ó mãe, se eu pusesse a tamanca bem estateladinha aqui à lareira, onde se visse, talvez ele me deixasse lá qualquer coisa…
−Não vês que a casa não tem chaminé…
− O Pai Natal podia vir pelo telhado e levantar uma telha…bater à porta…
−O Pai Natal não bate às portas. É como o vento. Bota-se a caminho e, pronto, está logo chegadoç Se quisesse, entrava pelo buraco da fechadura. Connosco pouco adiantava. A nossa porta nem chave tem. Basta o cravelho, não há cá que roubar. Mas, como te digo, o Pai Natal do que mais gosta é de descer pela chaminé. É para que saibam que vem do céu, à ordem do Menino-Deus…
− Ó mãe, mande pôr uma chaminé na nossa casa, mande! Queria tanto que o Pai Natal cá viesse…!
−Estás na lua. Uma chaminé é para quem é. Custa dinheiro. Onde o tínhamos nós? […] »

Aquilino Ribeiro in Sonho de uma noite de Natal (Centro de Estudos Aquilino Ribeiro, 2004: 8,9 e 10)

segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

A passagem de Ano em 1967, em Tite... pelo José da Costa!


Meus amigos:
Do "baú" do José Costa aqui vão belas recordações que ele amavelmente trouxe à nossa memória.
Para informação leia-se Convite - Cumbite, é a pronuncia do norte e dos naturais da Guiné também...
Sabes que eu acho que estás enganado, não era rojões em azeite mas sim rojões em banha de porco. Mais tarde fiz este mesmo petisco em minha casa e lembrei emocionado tantos destes momentos!
Para ti um abraço de todos nós.
Bem hajas!

""Oiii camaradas!!! Alguém se recorda deste dia, que foi a primeira passagem de ano longe da nossa família?

A Comemoração foi na arrecadação do Palma! Juntamos as goluseimas que entretanto nos haviam mandado, e fizemos uma farra. Lembro que eu levei uma lata que me haviam enviado daqui em Agosto ou Setembro desse ano de 1967 com rojões em azeite. Guardei-a para um dia especial. E esse foi o dia. Acontece que ao abrir, cheirava mal ou seja: a ranço! Eu sei que não comi, mas a lata ficou vazia!! Lembro que nessa noite ouve grandes bebedeiras entre nós. Estou a recordar-me dum amigalhaço que não recordo o nome o Alf. ? (Gordinho) salvo erro da manutenção.

Um abraço para todos e um bfs

Costa ""




José da Costa Confirmo que era azeite. Ou seja; - Os rojões eram conservados em casa em pote de barro vidrado em pingue (banha). Mas para "exportar" para famílias que à época moravam no estrangeiro, principalmente, Venezuela e Brasil, os latoeiros daqui, faziam um tacho em chapa. As pessoas iam ao latoeiro com os rojões e chouriços ou só chouriços, mais uma garrafa de azeite puro e colocavam lá dentro as peças e preenchiam com o azeite até à "gola". O latoeiro, soldava a tampa e antes do último pingo de solda, fazia força na tampa para retirar o ar e de seguida soldava a estanho. E assim eram despachadas normalmente por amigos que iam embora depois de passarem férias na terra. Assim aconteceu comigo. Um vizinho que estava em Bissau, veio de férias à Metrópole e no regresso, os meus familiares pediram para levar a "lata" e que chegado a Bissau fez chegar pelo correio SPM a "mercadoria".
Costa
30dezº de 2019"




domingo, 29 de dezembro de 2019

A passagem de ano de 1967/1968


Ainda a passagem de ano de 1967/1968 - pelo Justo
Falar de Natais em Tite...
Francamente, com alguns pormenores não me lembro de nenhum Natal a destacar, mas de uma grande ceia de fim de ano de 1967, primeiro ano do nosso Batalhão em Tite, já sobejamente relatado e  para mim e companheiro de apartment, Pica Sinos, de triste memória!!!...
  
Aqui vai um resumo:

Como sempre no pouco que escrevia para casa (o que me dói hoje pensar nisso) sempre tive o cuidado de compor o ramalhete sem pormenores de guerra nem lamentos, o que a juntar á desinformação e habitual escondidinho impostos pelo regime, tranquilizaria os pais, mau grado as saudades e o afastamento.

Fotos sempre limpinhas e felizes, relatos sobre caçadas, jogos de futebol (em que eu inábil nesse mister e devido a ter dois pés esquerdos, nunca participei) e principalmente relatos dos muitos petiscos que fazia-mos, o que até era pura verdade.

Numa das cartas da costumada pedincha que habitualmente antecedia as saudades e os beijinhos, pedia entre outros, um daqueles medidores plásticos de líquidos, porque já não lembro porquê, fazia-nos falta para as petiscadas.

Creio que foi no Natal de 67, o Palma arrancou com a ideia de se fazer uma festa com o maior número possível de pessoal, o Cavaleiro encarregou-se do MENU, que ficou super giro e combinou-se que cada um dos convivas arranjaria os comes & bebes  que entendesse para compor a mesa, sendo o lema; tudo para todos.

Foi mesmo um sucesso (tenho umas fotos que vou ver se descubro).
 
Comeu-se e bebeu-se em substância, e as vitualhas apareceram em quantidade e variedade. Vinhos e cervejas e creio que até houve um grupo que fez uma grande sangria num tacho de ferro.
  
Nesse tempo, e antes da tropa, como Lisboeta de gema BA, já tinha o vício dos petiscos e como, pouco a pouco, lá fui chegando a casa cada vez mais tarde (durante anos apanhava sempre na Estação do Rossio o último comboio, o das 2,25 h, o que adorava, pois apanhava todo o pessoal dos teatros do Parque Mayer, no regresso a casa, depois da segunda sessão, com as lindas coristas e principalmente com o MAX, que era um espanto de humor e boa disposição.  Eu e o grupo bilharista do Café Nacional, tinha-mos conta aberta, a pagar no fim do mês, nalguns tascos conhecidos e eram jantaradas de horas. O dono era galego, e a oração era sempre a mesma “si num pagas una vez, te corro com lo porro (pau)”.
  
Lembro-me do Bife do Luanda, do Relento de Algés e da Trindade, embora este último já fosse puxado para os nossos bolsos.

Dessa ceia de  Natal em Tite, ainda hoje tenho no palato o sabor dos enchidos da província que a maioria dos camaradas tinha pedido para casa. Não se via muito por Lisboa material daquele...chourições, linguiças, alheiras, torresmos e sei lá que mais, em que até a gordura era divinal.

Claro que queimei bem, pois o motor estava a aquecer com tanto petisco de eleição...

Abreviando:
O tal copão plástico que tinha pedido para casa, estava-me a servir de copo, e recordo que me deu um travadinha que comecei a deitar-lhe um pouco de cada bebida da mesa??!!...e ato contínuo...em duas ou três goladas...ficou vazio??!!....

A ceia, fez bastante sucesso no aquartelamento e alguns furriéis e oficiais, depois das suas ceias nas messes próprias, vieram até à nossa para continuar a petiscada.

Entre eles o Alferes Médico do Batalhão...que eu admirava imenso.

Virei-me para ele de copão em riste e disparo: - É pá és um médico porreiro, és de Lisboa??!!...e passados momentos, caio redondo no chão??!!...

Pobre do Pica Sinos e do médico que me aguentaram creio que dois dias, in extremis com coma alcoólico, resultado final da brincadeira do copão.

Gostava de ter tido durante todos estes anos a oportunidade de por feliz acaso reencontrar o nosso Médico.

Ao Pica, não há obrigados que cheguem...devo-te a vida companheiro!!

José Justo.
(Novº2013)

sábado, 28 de dezembro de 2019

Votos de Feliz Ano Novo de 2020


VOTOS DE FELIZ ANO NOVO DE 2020
Para todos os nossos companheiros, amigos, familiares e visitantes, votos extensivos às Gentes de Tite.
Leandro Guedes.




Há-de vir um Natal... , de David Mourão Ferreira!


""Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio.
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Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido
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Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo
-
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido
-
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro
-
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo
-
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido
-
Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito
.

Ladainha dos Póstumos Natais, de
David Mourão-Ferreira 

Operação Galo foi um fracasso


OPERAÇÃO GALO FOI UM FRACASSO 
MAS O NATAL FOI CELEBRADO

Lá longe, todos tivemos a oportunidade de presenciar e de ver: o místico pôr-do-sol, o calar da passarada, o breu e o luar ao cair da treva. Mas tenho dúvidas, que essa oportunidade se observasse, para todos, com o nascer dos dias em Tite.
  
Por força da especialidade que desenvolvia, noite sim, noite não, as horas eram passadas acordadas. Muitas delas, sentado junto á porta do Centro de Cripto, para ver o nascimento dos dias que sucediam.
  
Não eram menos bonitas, comparativamente com os dias onde era visível o sumptuoso pôr-do-sol, as alvoradas em Tite. A luz era diferente, mas também de uma beleza apaixonante, sobretudo após a época das chuvas, nos meses de Novembro e Dezembro, onde o cacimbo e a escuridão se dissipavam com a aproximação do astro-rei que ao erguer-se lentamente a destruía.
  
Como era bonito e encantador ouvir o chilrear da passarada ao acordar. Como era “refrescante” e ao mesmo tempo “agitador” o “perfume” do pão a cozer e do café certamente a ferver, que os padeiros e os cozinheiros manipulavam, no edifício do refeitório, desde as seis horas de todas as manhãs.
  
Como tudo hoje se faz luz da tristeza que senti naquela véspera de Natal de 1967. Pela primeira vez na vida estava impedido de passar o Natal com a minha família.
  
Como estava triste de não poder observar a iluminação natalícia certamente erguida no Rossio, e as montras eventualmente repletas de brinquedos na minha baixa Lisboeta.
  
Desanimado, juntei-me a uns quantos (poucos) companheiros de “route” com vista a organizarmos uma festa de Natal sem romper a tradição – peru assado –, já que na noite da consoada, o Comandante do Batalhão, ofereceria, para além do discurso da ocasião, o bacalhau cozido com batatas e couves.
  
Mas encontrar um peru em Tite ou nos arredores era hipótese à partida frustrada. Ninguém avistara perus. Havia sim, numa das palhotas da tabanca, junto á pista de aviação, um galo português de elegante porte, com crista vermelha e alta, multicolor nas penas, de bico e esporões bem afiados e, quando cantava a anunciar o nascer do Sol, era ouvido por todos aqueles, que como eu, por força das circunstancia estavam acordados, tal não era o seu “folgo”.
  
Então a “operação” galináceo é posta em marcha, consistindo em distrair a proprietária, uma velha preta, senhora bem forte, que por norma estava sempre de sentinela á pastagem da real ave, sentada num banco corrido, colocado na frente da sua palhota, e apoderarmo-nos do galo, certamente já morto, após paulada bem forte aplicada “no cabeça”.

  
Assim, dois de nós começaram por espalhar milho uns metros antes do galo em pastagem, procurando que o mesmo se deslocasse em nossa direcção quando na “picagem no milho” disperso. Os outros, assumiram posições estratégicas para barrar, eventualmente, alguém que nos quisesse intersectar na correria da fuga.
  
No decorrer da “operação”, a preta, ou adivinhou, ou alguém lhe disse das nossas intenções, pois sem esperarmos, desata numa berraria, de vassoura em riste e com ar ameaçador na nossa direcção, dizendo, …”ah bo fora, ah bo fora”… frustrando de todo o nosso propósito.
  
De todo, ainda procuramos comprar o galo, mas viemos a saber que o galináceo jamais serviria de manjar a quem quer que fosse, a dona tinha-o como animal de estimação.
  
Resultado:
 Sem galo na travessa, mas no dia de Natal, a mesa estava farta com o pouco, que os familiares e amigos nos fizeram chegar.

Assim foi, naquela terra em guerra, a passagem do Natal de 1967
  
Tenham um bom e Santo Natal.
 Pica Sinos
(dez2008)

sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Homenagem do Municipio de Ovar ao nosso amigo José da Costa






Publicamos aqui um folheto que foi imprimido em 2014 pelo Municipio de Ovar e em que o Costa é o visado.
Neste folheto é dito que: "VALEU A PENA CONHECÊ-LO.!"
Nós confirmamos.
Um abraço velho amigo.
Leandro Guedes.

Ele é numero UM no Quadro de Honra dos Bombeiros de Almada.


ELE É O Nº 1 NO QUADRO DE HONRA DOS BOMBEIROS DE ALMADA
O encontro do Duque com o Pica Sinos, no Natal de 2008
Natural da cidade – onde o rio é mais azul, e em certos dias tem a mesma cor do céu – Setúbal –, o Manuel Duque, o “Duque” com a especialidade de maqueiro, como nós o conhecemos em Tite, veio para Almada aos 14 anos. Foi mecânico de balanças na antiga Casa Romão, e aos 17 anos abraça a profissão de bombeiro.
O Manuel Duque, o Chefe Bombeiro, amado e respeitado por todos que de perto com ele convivem, hoje, aos 63 anos de idade, é o nº 1 no Quadro de Honra da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Almada.
Perante o encerramento dos Estaleiros da Margueira (Lisnave), e após 30 anos de serviço que ali dedicou como bombeiro, o Duque não escolheu, nem estava, ou melhor não podia estar, no seu horizonte escolher um outro caminho, senão o de soldado da paz! Ingressando, logo após o seu despedimento, no quadro efectivo dos Bombeiros Voluntários de Almada,
Fui ao encontro do “Duque”! Já no quartel, envergando o fato de trabalho, vejo-o a arrastar uma perna sofredora certamente por reumático, vem acompanhado por um outro camarada do serviço – o Sargento Alberto -! Apercebo-me que as suas palavras saem da sua boca “enroladas e em catapulta” resultantes de um AVC que recentemente o vitimou, diz. Quando na parada é com muito agrado que converso, neste primeiro encontro, com este nosso camarada. Foi gratificante verificar as muitas fotografias da vida em Tite religiosamente guardadas.

Dessas, uma particularmente mostrou – o Corpo clínico em Tite – apontando um a um, com os olhos rasos de água, a custo lá disse “ a maioria já se foi”. E uma outra, o seu inseparável amigo – o Joke – que para todo o lado o acompanhava. Em Tite passou pelo Duque muitas histórias: com o “JoKe” do Heitor, que não sendo o dono – mas sim tratador – eram inseparáveis. Com as duas corujas enormes, de cor branca, cujo “funesto assobio” arrepiava tudo o que era cabelo, não deixando dormir aqueles que por perto da enfermaria/farmácia habitavam. Outras, ainda ligadas à sua especialidade, quer em operações no terreno, quer no posto clínico.
Este camarada com um comportamento que lhe era peculiar – educado, paciente e obstinado! - Uma vez, faz-me o Botas lembrar, consertou uma bicicleta tipo “pasteleira” que num canto estava abandonada, onde nos dias de folga, sobretudo aos domingos, aproveitava – vaidoso – para dar as voltas ciclo turísticas pela tabanca, vestindo sempre uma tchart com motivos havaianos que “desviou” dum monte de roupa usada destinada a distribuir pelos naturais. Uma semana após o nosso primeiro encontro, com a presença do Comandante da Associação (Vítor E. Santo), do Sargento Bombeiro (Alberto) e do Zé Santos (Alcântara), no almoço que o Duque fez questão de nos presentear, apercebo-me, mais, que este nosso companheiro, já reformado, com 46 anos de bombeiro, ainda presta serviço nas áreas da manutenção e da conservação na instituição. Apercebo-me do superior destaque dos feitos do Duque em bravura, e dos serviços prestados à comunidade, não lhes cabendo no seu largo peito as medalhas – desde o bronze ao ouro - que lhes foram merecidas ao longo dos anos, por muitas e variadas entidades.
Bem hajas Duque! Pica Sinos
(NATAL2008)

quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

O Matos no Natal de 2008


O MATOS NOS DIAS DE HOJE (no Natal de 2008)
AS SUAS “PÔPAS” EM TITE
FARIAM INVEJA AOS “PUTOS” DESTA ÉPOCA
-
Pelo meio da manhã, véspera do Natal, desço a Rua Garrett, o Chiado como dizem os lisboetas, e sou surpreendido por gente do circo!
…Uma grande bicicleta montada por um jovem todo de branco que apregoava…Olha o circo…Olha o circo…um outro no cimo de altas andas, também. Na frente duas lindas majorettes, bem caracterizadas e muitos sorridentes, contribuindo com a sua graça para a frescura da manhã que se faz sentir. Por último a charanga. Devem ser, todos, da Companhia de Teatro do Chiado – Mário Viegas.
O Chiado, que eu amo, foi refúgio favorito do Fernando Pessoa e do Eça de Queiroz. Foi pólo intelectual de Lisboa no século XX. O Chiado diz o poeta…não pode ser explicado apenas sentido…É verdade! Só no Chiado eu consigo “sentir” a vivência dos dias quando me encontrava com a minha amada, na esquina do Eduardo Martins, no final dos dias de trabalho. Mas deixemos isso por agora, estou aqui para “falar” do Matos!

O Joaquim Correia de Matos, 1º Cabo de Transmissões em Tite, nasceu em Lisboa a 27 de Novembro de 1945. Aos 10 anos já trabalhava na oficina de sapateiro do seu pai. Seguiu a profissão de empregado do comércio – Caixeiro – vive desde há muito em Arruda dos Vinhos, (concelho que faz fronteira com o de Vila Franca de Xira), e é nesta manhã fresca e animada que vou ao seu encontro numa das sapatarias de luxo, na Rua Garrett, onde trabalha há 39 anos.
O encontro desenrola-se à mesa num “café”. E começo por dizer que o objectivo é…satisfazer muitas perguntas de antigos camaradas que não se cansam de por ti perguntar, pois, há muitos, muitos anos não te vêm…, digo!
Olha, diz… são muitas as vicissitudes da vida que me levaram a não me encontrar com os camaradas… não exemplificando, vai dizendo que… o tempo que passou na Guiné o considera em duas partes:
…Uma, bastante má, que era naturalmente a guerra, com todos os problemas. A principio o medo que é natural em qualquer um de nós. Depois vamo-nos habituando à situação!...
…Mas a situação psicológica era bastante grande, e na parte final com o regresso já próximo a ansiedade aumentou!...Mas tudo se passou e terminou o martírio e o regresso aconteceu!...Ficaram alguns traumas, infelizmente alguns ficaram por lá!...
Não o interrompo, respeito o seu desabafo que também é meu.
…A outra parte, diz…a boa, foi naturalmente o convívio e a camaradagem, derivado também da situação difícil em que vivíamos nos “obrigava” a aproximar mais uns dos outros…
…Posso de uma forma resumida dizer que apesar do seu lado mau, devido à situação de guerra, foi uma experiência que nos ensinou o lado mau (sublinha) da vida…
Com este grande e humilde camarada, lembro-me de dois acontecimentos: um na viagem e um outro já em Tite; o seu enjoo no barco que durou (8 dias), desde a passagem da Ponte sobre o Tejo até Bissau, e a febre tifóide que contraiu e o levou ao internamento hospitalar durante três meses.
Ainda uma outra, (que irritava o pessoal, mas de fazer inveja aos “putos” de hoje) recorda-me o Costa, eram os suas “pôpas” nos penteados “enroladas em brilhantina”, contrastando com o fardamento roto e empoeirado, levando a “malta” numa das vezes, pela força, fazer mergulhar a sua cabeça dentro de um bidão de agua que estava por perto.
Despeço-me do Matos com um…até amanhã! Mas deu para perceber que, em Ovar, no próximo encontro do pessoal, lá o teremos para o abraçar.
Raul Pica Sinos
(dez2008)

Nota - O Matos faleceu em Novembro de 2018. Paz à sua alma!

quarta-feira, 25 de dezembro de 2019

O NATAL AMANHÃ...


AMANHÃ…………….
.
Não sei.
Serão os nossos filhos e netos que irão gerir a herança que lhes deixamos.
Espero que a saibam aproveitar e não deixem morrer os valores que lhes ensinamos.
Até
Poderão vir a ser os donos do mundo.
Ter muitos carros, vivendas e muito dinheiro
Dar muita vida aos espaços comerciais. Com muita luz e cor
Pôr muitas pistas de gelo
Pôr as cidades vilas e aldeias ainda mais iluminadas e bonitas
Pôr as ruas ainda mais cheias de luz e cor.
Com mais árvores luminosas
Com muitas renas e kilómetros de tapetes vermelhos.
Poderão dar mais presentes
Encher a casa de prendas
Poderão até correr desenfreadamente à procura do nada

Do supérfluo
Poderão até comprar o poder
Sim o poder também se compra!
Poderão comprar benesses e favores
Até poderão........
Temo é que ELES não tenham a inteligência suficiente para parar e pensar
Pensar na família, nas crianças, nos amigos
Pensar num Mundo puro e sem maldades
Temo que aplaudam e sigam os maus exemplos da corja nojenta de corruptos
Que nos rodeia
Temo que não tenham força e poder para bani-los da nossa sociedade
Temo que desculpam o criminoso e punam a vítima
Temo que desculpam o bandido e culpabilizem o benfeitor.

Se não conseguirem, creio bem no fim do Natal.

Por favor corram desenfreadamente à procura de carinho, solidariedade e humildade.
Por favor não enganem o Natal.

Que Eles saibam ser dignos de NÓS.
Feliz Natal
António Cavaleiro
(dez2010)

O Costa faz hoje anos



Parabéns ao Costa por mais um aniversário. Votos de boa saúde e bem estar, que continues em forma amigo.
Um grande abraço. Leandro Guedes.
                        

terça-feira, 24 de dezembro de 2019

O NATAL DA MINHA INFÂNCIA...!


O NATAL DA MINHA INFÂNCIA

Logo no primeiro dia das férias escolares, dava-se início à “construção” do presépio.
Munidos de sacholas, enxadas e outros utensílios íamos pelos campos apanhar: musgo, terra, esta de preferência de cor avermelhada (barro), arbustos e pedras, para que estivéssemos na posse de tudo o que era necessário para a nossa grande tarefa….
Depois era deitar mãos à obra e fazíamos de tudo……, bastava um pouco de imaginação e alguma arte…
Com papel-cenário de côr azul, conseguíamos obter um céu lindíssimo, as estrelas eram desenhadas e recortadas em cartão e depois forradas, umas com papel-prata e outras com papel-dourado; construíamos os montes, os vales, os caminhos, os riachos e ribeiras; com algodão fazíamos a neve que traduzia a existência do frio próprio da época…. enfim, tudo era feito com uma dedicação tal que, acabado o presépio, estávamos perante uma autêntica obra de arte e com a consciência do dever cumprido.
Depois ficava-nos a grande ansiedade pela chegada da noite de Natal. Era na verdade um grande momento…

Pôr o sapatinho na chaminé na noite do dia 24 de Dezembro, para que o Menino Jesus pudesse deixar presentes àqueles que, durante ano se tinham portado bem, que tinham sido obedientes, bons alunos, etc, etc…..era a tradição que todos nós (os actualmente sexagenários) conhecíamos, era aquilo que os nossos pais e avós nos transmitiam e que na verdade tinha tanta beleza, tanto encanto….
O Jantar de Natal era com toda a família reunida e, à meia-noite, todos ou quase todos, iam assistir à missa do galo.
Porém, ninguém se ía deitar sem primeiro depositar, junto à chaminé os seus sapatos, ou botas, sim porque se defendia  na altura que, nas botas, o Menino Jesus teria possibilidade de deixar mais e maiores presentes…...
No dia seguinte, bem cedo, era a corrida à chaminé e a grande alegria para os mais novos que se deliciavam a abrir cada um dos presentes que o Menino Jesus tinha escolhido para lhes oferecer….
Era assim o nosso Natal…….
E como era interessante, como era lindo, como era mágico……

Que saudades....
Albertina Granja
(Dez2010)

segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

A mensagem do nosso comandante


O nosso capitão Paraiso Pinto, também ele um info-excluido, envia a sua mensagem de Natal e Ano Novo, com votos de Feliz Natal e boa saúde, para todos aqueles que estiveram em Tite, na Guiné/Bissau e seus familiares.

Boas Festas do Carlos Azevedo



A todos quantos permanecem na minha memória e a quantos me retêm na sua memória eu desejo Boas "FESTAS NATALÍCIAS" .
Saudoso abraço .
CARLOS AZEVEDO

Votos de Feliz Natal do nosso Coronel Ventura Vaz.


O nosso Coronel Ventura Vaz, que não mexe nas novas tecnologias, envia um grande abraço a todo o pessoal de Tite, com votos de Natal Feliz e Bom Ano 2020.

Votos de Feliz Natal do Mestre e Vilão


Os nosso amigos Mestre do Monte Fialho e Vilão de Coimbra, enviam um grande abraço com votos de Feliz Natal e Bom Ano de 2020, a todos os companheiros e amigos do BART 1914 e restantes Unidades.

O NATAL HOJE...

O NATAL HOJE………..
.
Uma noite igual a tantas outras
Diferente da noite de ONTEM
As pessoas
A ausência
Os sentimentos que não somos capazes de transmitir
Os filhos
As desilusões, os desencontros
A impaciência e a desconfiança
A traição, a angústia a dor e o medo.
O medo da doença
O emprego e a falta dele
O medo do dia de amanhã
Os media e as notícias
A corrupção e a vergonhosa existência de gente podre de rica
Ninguém sabe como
Alguns sabem
Também eles miseráveis.
Desgraçados!
E desgraçados deixaram tanta gente boa
 Podres de ricos
Os bancos e os Administradores de mau carácter
Os empréstimos e o receio do despejo
A inveja, a competição a incompetência
A partidarite, os tachos e os boys
A bufaria e a bajulação
Ontem, também os  havia
Notavam-se menos.
Havia vergonha em ser notado.
Hoje são uns desavergonhados
Os da partidarite e seus lacaios
Hoje é angustiante ter de viver com  tantos “sem-vergonha”
A violência, o crime e os assassinos organizados e desorganizados
Os constantes flagelos naturais
As secas, as cheias e a poluição ambiental
Os tsunamis
O computador, a internet o facebook e tantos outros
O consumismo desenfreado
O pinheiro de plástico. Que já não é só verde.
Também é vermelho, branco……..
As lâmpadas led
Nada se faz, nada se cria, tudo se compra
Neste Natal  faz-se de conta. Nada de mal existe
Não há crise
As pessoas são todas inteligentes e honestas
Faz-se de conta
Vive-se stressado numa correria constante
Faz-se de conta
Correm. Atropelam-se
É a “magia” do comprar e dar presentes
Decididamente um absurdo
Como tudo é diferente!
Mas……………..
Ainda conseguimos, felizmente
Pôr na mesa os valores éticos, morais e sentimentais de ontem.
O conceito de família prevalece. Por enquanto.
O ontem e o hoje leva-me a concluir que o homem errou em muitas das experiências que foi fazendo ao longo dos tempos.
Brincou demasiado com a humanidade.
António Cavaleiro
(dezº2010)

domingo, 22 de dezembro de 2019

O Natal não é um história de faz-de-conta...


O Natal não é uma história de faz-de-conta


Quando uma família vive a generosidade que é própria do amor cristão, o Natal não é uma história faz-de-conta, nem uma mera evocação, mas algo encantador que acontece. Santo Natal!
Quando o João passou pela esquadra do bairro, o subchefe, baixote e barrigudo, como a função exige, apresentou-lhe o Manuel, um rapaz de cinco anos.
A sua história era breve, como breves são sempre as desgraças. Órfão de mãe, vivia com o pai, conhecido traficante de drogas que, apanhado em flagrante delito, recolhera, por ordem do juiz, ao calabouço, deixando só aquele único filho, que também não tinha parentes próximos que o pudessem acolher.
Era já a antevéspera do Natal e, como depois se metia o fim de semana, o subchefe não tinha tempo para, antes das festas, pedir à segurança social que providenciasse o destino do menor.
João, pai de numerosa e barulhenta prole, teve então uma feliz ideia:
– Pois olhe, subchefe, se quiser, eu levo o miúdo para casa, porque, onde estão dez, também cabem onze e depois logo se vê para onde vai o rapaz. Assim, pelo menos passa estes dias em família, enquanto se arranja melhor solução.
Ao agente da autoridade a ocorrência pareceu óptima, sobretudo porque assim ficava aliviado daquele imbróglio. Por outro lado, sendo o João um bom médico e excelente pai, o Manuel não poderia ficar em melhores mãos.
Dito e feito. Era já hora de jantar e o João ligou pelo telemóvel para a sua mulher, para a advertir da demora e do novo comensal. Mal chegou a casa, apresentou o Manuel à Luísa e aos filhos:
– Este é o Manuel e vai ficar connosco uns dias. É como se fosse um presente de Natal para toda a família! Como só tem um ano a menos que o Miguel, o mais novo cá de casa, fica no seu quarto.
O benjamim ficou radiante com a responsabilidade de acolher o Manuel e fez questão de que se sentasse ao seu lado, na ampla mesa da casa de jantar. Para o Manuel toda aquela algazarra era algo insólito, pois nem sequer os nomes deles conhecia. Mas, como todos o tratavam com tanta naturalidade, parecia que se conheciam desde sempre.
Foi preciso improvisar uma cama, o que se conseguiu armando um divã que estava no sótão, e arranjar um pijama e uma escova de dentes para o Manuel, que não trazia nada com ele. Para vestir no dia seguinte, a Luísa foi buscar algumas roupas antigas do Miguel, que já não lhe serviam e que tinha guardado para dar na paróquia.


Os dias foram passando e Miguel continuava a ser o seu mais próximo amigo, com quem partilhava o quarto, a roupa e os brinquedos. A integração do Manuel era tão perfeita que era difícil distingui-lo dos filhos: todos conviviam em absoluta igualdade.
A bem dizer, era mais do que perfeita, ou perfeita demais, porque parecia quase irreversível, tal o apego de parte a parte. Por isso, João aproveitou uma saída da Luísa com o Manuel, para se reunir com os filhos, a quem explicou a situação. Depois de recordar que o levara para casa porque o pai dele fora detido e depois se evadira, advertiu que era provável que o Manuel tivesse de ir para alguma instituição, ou fosse entregue a algum seu familiar. Terminada a exposição, só o Miguel fez uma observação, com uma não contida raiva:
– O pai – disse – é pior do que o pai dele!  
Dito isto, saiu porta fora, com cara de poucos amigos. Os outros filhos sorriram com aquela atitude do mais novo, que tinha tido a coragem de dizer, em alto e bom som, o que todos, de algum modo, intuíam. Ninguém se lembrou de que já eram muitos, que o espaço era escasso e remediada a economia familiar. O Manuel era da família, ponto final parágrafo.
Esta história verídica, com já mais de dez anos, aqui transcrita com nomes e circunstâncias fictícias, teve um final feliz: o Manuel foi adoptado por aqueles pais, que já o tinham como seu, e pelos filhos deles, que já eram, de facto, seus irmãos.
Quando uma família vive a generosidade que é própria do amor cristão, o Natal não é uma história faz-de-conta, nem uma mera evocação, mas algo encantador que acontece.
Santo Natal!

P. Gonçalo Portocarrero de Almada
Sacerdote católico
 (dez2014 - enviado por Nuno Martins)

O Natal e o Avião que dava cambalhotas


O NATAL E O AVIÃO QUE DAVA CAMBALHOTAS

 ...Bom dia Georgina… disse sorridente a Ti Rosa, no momento que empurrava a porta de entrada da minha casa.
…Bom dia…respondeu-lhe
…Que frio que está hoje e, tu pela manhã, já a limpares e, a arrumares o tampo da comoda…

A comoda que, em casa existia, ficava situada no lado esquerdo da entrada. Quando pequeno, a altura do móvel dava pelo meu peito. No comprimento, tinha 3 gavetas sobrepostas. Ocupava todo o espaço da parede até ao quarto.
No tampo, estava colocada uma toalha de renda, alguns biblôs, uma jarra, sempre composta com as flores do quintal e, algumas imagens de santos. O candeeiro de vidro, a petróleo, estava ali mesmo à mão, uma ou outra fotografia, por lá, também se via.

…Não filha…ripostou minha mãe
…Estou a tirar tudo do tampo da cómoda para construir o presépio…
…O Raul foi à mata, buscar musgo, não deve tardar…

Apanhar e carregar o musgo, todos os anos, para o presépio, era da minha responsabilidade.
De balde de zinco na mão, uma faca, alguns velhos papéis dos jornais para separar as camadas do musgo que, viria a ser arrancado da terra, lá ia eu a caminho da mata de São Domingos de Benfica, ou da serra de Monsanto.
O balde já por si era pesado, carregado com o musgo, pior um pouco. Era um recado/trabalho que fazia com muito gosto.
O presépio, lá em casa, era muito bonito! Todo ele era feito de bonecos de barro, excepto a cabana que era de palha.
Na cabana de palha estava o menino deitado nas palhinhas da manjedoura, acompanhado das imagens exigentes da tradição.
Tinha na sua frente, ao longo do tampo da comoda, espalhados no musgo, todo um aparato de pequenos bonecos. Uns representando a vida numa aldeia. Outros, a vida do pastor no monte, com o cão e, as ovelhinhas a pastar.
Não faltava uma pequena cascata, feita da folha de prata, a imitar a água a correr para um lago, não mais que, um pequeno espelho, contendo um ou dois minúsculos patos.

…Anda cá oh Rosa…disse-lhe a D. Georgina, minha mãe.

…Quero-te mostrar o brinquedo que vou pôr no sapatinho do Raul…
…Comprei-o na papelaria do Chico…
O Sr. Chico tinha uma papelaria na Cruz da Pedra. Vendia também brinquedos.
Estava situada um pouco à frente da Pastelaria (A Colmeia), na Estrada de Benfica, perto da loja de eletrodomésticos, onde o Bica, da minha rua, mais tarde veio a trabalhar para aprender a profissão de eletricista.
A loja do Sr. Chico, por esta época festiva, era das poucas lojas, em redor do velho Bairro das Furnas, que, tinha a montra mais recheada de brinquedos.
Era costume ver a pequenada, pasmada, encostada aos vidros da montra, a admirarem todo aquele aparato.
Eu já fizera há muito a minha escolha, “perdendo”, quando pela loja passava, largos minutos a vê-lo trabalhar.
Maravilhado, perguntei à minha mãe se o Pai Natal me podia dar?
Da resposta apenas obtive o silêncio.
…Oh Georgina foi caro? Pergunta-lhe a Ti Rosa. 
…O Sr. Chico deixa-me pagar por 3 vezes… retorquiu
…Eu, para a minha mais velha, vou comprar umas meias de vidro, destas agora, sem costura. Para os outros ainda não sei…avançou indecisa a Ti Rosa.
Naquela noite, 24 de Dezembro, do ano de 1953, o poial da chaminé da minha casa estava muito branquinho. Não passara uma semana que fôra caiado.
Tinha em cima dos azulejos uma pequena toalha de cor branca, 2 sacos de flanela de cor vermelha, um meu sapato cardado na sola, couro amarelo e ensebado, onde supostamente, o Pai Natal iria colocar os brinquedos por mim solicitados e, ainda, os pedidos pela minha sobrinha Madalena, então com 4 anos.
Bem fiz aturados esforços contra o sono, na espera da meia-noite, mas o “joão-pestana” foi bem mais forte.
De manhã cedo, ainda noite escura, corro para a chaminé para ver das minhas sortes!
Eu o pressentia!
Lá estava a minha paixão!
…O meu primeiro brinquedo de corda. O avião que dava cambalhotas e que, durante alguns dias, o via deslizar nas improvisadas pistas na montra da loja do Sr. Chico…
Não posso descrever o sentimento dos meus pais ao assistirem à minha alegria, mas recordo de
como era bonito ver contentes, com os novos brinquedos, nesse dia de Natal, os miúdos/as da minha rua.
Que vaidoso estava, por brincar com os demais, vendo o meu avião de corda “voar” e a dar cambalhotas na “pista” da velha Rua dos Plátanos.
Foi assim o dia de Natal, naquele ano.
Hoje, nesta quadra natalícia, quero os dias a correrem depressa. Quero ver retratado, nos lindos rostos, das filhas e das/o netas/o, a alegria originada pelas prendas “oferecidas” pelo velho Pai Natal.
Dezembro de 2012
Nota:A imagem do avião, igual ao brinquedo que me foi oferecido neste Natal, foi copiada, com a divina vénia, do Blog Meus Brinquedos Antigos

Pica Sinos
FELIZ NATAL e
BOAS FESTAS
(dez2012)

sábado, 21 de dezembro de 2019

O Natal da minha infância... pelo Joaquim Caldeira!




"O Natal da minha infância 
Recordo que havia sempre muito frio, por vezes muita neve e, invariavelmente, gelo que se acumulava nos beirais das casas e nos caminhos e riachos. A igreja matriz era devidamente enfeitada para poder transmitir aos fiéis uma onda de misticismo condicente com a época. Passava-se isto na aldeia de Louriçal do Campo. Para quem não souber onde fica, eu ajudo. É na base da serra da Gardunha, na vertente sul. Durante cerca de uma semana que antecedia o dia de Natal, havia um grupo de rapazes mais velhos do que eu, juntamente com homens que se voluntariavam para arrancar o cepo da maior árvore que houvesse nas redondezes e carregá-lo para o adro da igreja a fim de, na véspera, se poder fazer o braseiro que arderia durante vários dias até se extinguir ou a chuva o apagar. Durante a fase em que ardia, era frequente ver rapazes, - raparigas não, - a atiçar o lume ou aquecer pés e mãos, enquanto se divertiam. Em casa, as mães já tinham feito as filhoses em quantidades muito grandes para poder satisfazer a gula dos mais novos, competindo para fazer a maior quantidade. Era tradição. Chegado o dia era a entrada solene na Igreja onde o padre muito bem paramentado aguardava os fiéis enquanto se ouviam cânticos próprios da época. Seguia-se o sermão onde se explicava a origem da tradição e o seu valor religioso. Ao lado via-se o presépio sempre muito bem construído e enfeitado. Ainda hoje dá gosto lembrar. No final era tradição beijar o pé do Menino. Filas para esse acto. Finda a cerimónia era caminhar para casa para um almoço diferente. Mas pouco, porque não se vivia com a fartura que há hoje. Após a refeição, os mais novos brincavam com os presentes, quando os havia. Nesse tempo, quem queria brinquedos tinha de fazê-los. Eu nunca chegava a entender como o Menino Jesus nascia em família tão pobre e em dia tão frio para salvar os homens e vinha a morrer três meses depois já com trinta e três anos. Era muito pouco tempo para tanto mistério. Por vergonha nunca pedi que mo explicassem. Talvez ainda hoje não entenda muito bem. Durante esta quadra, por não haver escola, tinha mais tempo para brincar com os meus irmãos e fazíamos grandes bonecos de neve que se mantinham por vários dias, até que a chuva ou o sol os derretesse. As árvores estavam lindas, cobertas de neve, e algumas partiam com o peso enquanto os ribeiros congelavam e o gelo se formava sob a terra dos caminhos fazendo um ruído próprio quando pisado. Tudo tão diferente do natal que comemorei no ano de 1968 em que, em Fulacunda, após uma ceia tão agradável quanto possível, nos foi servido o filme “O Homem das Pistolas de Ouro” e, cinco minutos após fomos servidos de um ataque que provocou um rasto de morte, feridos e destruição. O filme continuou a correr em sala vazia até que cortaram a energia e tudo parou. 
Mais tarde tentei recriar o Natal da minha meninice para o servir aos meus filhos. Já não era possível. Tudo tinha mudado. Hoje, resta a saudade. Tenham um bom NATAL. 
Joaquim Caldeira"
(dezº2010)

sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

O Natal... ontem !


O NATAL ... ONTEM !

Fazia frio, às vezes chovia, era noite.
Horas perdidas no tempo, ao frio e à chuva.
Brinquedos de Natal.
Nariz esborrachado no vidro da montra.
Olhos de felicidade.
O combóiinho passava.
Carruagens atreladas umas às outras…..
Ora apareciam, ora desapareciam…..
Escondiam-se. Voltavam a aparecer.
Deslumbrante!
Aviões presos com fios. Parecia que voavam!

Bonecos, bonecas e palhaços.
As motas e os carrinhos em alumínio.
Vermelhos, pretos. Alguns brancos e amarelos.
O presépio com peças em movimento.
Era fascinante!
Em casa
Não havia computador nem televisão.
Nem aquecimento central.
Havia o rádio. Nalgumas casas.
O pinheirinho lá num canto. Em cima de uma mesa.
Pinheiro do monte.
Muito algodão, fios e figuras em papel prata coloridos.
Pendurados e adornando lá estavam
Os cigarrinhos, quatro motas, quatro violas,
Quatro relógios, quatro coelhinhos e
Um Pai Natal. Tudo em chocolate.
Intocáveis até aos Reis.
Na noite de Reis era desfeito o pinheirinho.
Era feita a repartição.
Espaço de tempo interminável. Aqueles chocolates……
Tocava neles. Que vontade de arrancar uma viola!
Não! Os rituais são para ser cumpridos.
Na base do pinheiro, simples figuras toscas
Sobre o musgo da encosta
Simbolizavam o nascimento.
O fumo e o cheiro abundavam
Era um fumo bom, agradável
Fumo e cheiro aquela noite
Cheiro e fumo de abundância.
O pinheirinho era feliz.
Nós éramos felizes.
À mesa
Uma noite igual a tantas outras
Diferente na azáfama e nas regras
A família estava mais presente
Era uma noite de sentimentos
Sentimentos de família
Sentimento de alegria de solidariedade e de partilha
As crianças eram o mundo
Era uma noite condescendente.
O bacalhau, as batatas, o nabo e a hortaliça ajudavam
Os bolos de bacalhau
O vinho igual ao de todos os dias
As rabanadas, os mexidos a aletria o leite creme o arroz doce.
Delicioso. Tudo era bom
Um cálice de”vinho fino”. Dava direito.
As nozes, os figos, as passas, os pinhões.
Às vezes, jogávamos as cartas
O rapa. Jogávamos aos pinhões
Com casca.
Vezes houve que fui  à missa do galo
A igreja era perto de casa
Era à meia noite. As doze badaladas.
O silêncio da noite era lindo
Ia  com a minha avó.
O fogão já não dava calor
Estava quase frio
Era bom que arrefecesse depressa
O sapato queria dormir em cima
À espera do Pai Natal.
Apagavam-se as luzes.
Cansados de alegria a cama chamava.
Felizes.
Foi a noite de Natal.
De manhã o espanto
O pai Natal passou por aqui!
O sapato irradiava a felicidade que não conseguíamos transmitir.
A curiosidade apoderava-se!
Não interessava o quê!
Fosse o que fosse era o selo do merecimento
O valor das coisas não se avaliavam pelo seu custo
Uns chocolates, umas nozes, uns pinhões. Às vezes uma camisola.
Às vezes uma nota que oferecíamos de imediato à mãe e ao pai
Portei-me bem durante o ano
Era a recompensa de uma ilusão
Ficávamos muito gratos ao Pai Natal!
Não se podia exigir mais
Eram muitas as crianças que se portavam bem
Quase todas.
O Pai Natal era pobre
Nós também.
Ricos de alegria e felicidade
Compreensivos e agradecidos
António Cavaleiro
(dezº de 2010)

Natal, é quando um homem quiser! - José Justo


Natal
Desde sempre, tive a feliz dita de uns Natais que sempre recordarei.
Fui abençoado por tudo o que em criança e mais tarde como adulto, ansiei nesta quadra.
A árvore de Natal enfeitada com lindos adornos de purpurinas multi coloridas feitas por meu pai., com pinhas e bogalhos.
O presépio completíssimo, de menino Jesus abençoado pelo padre Carvalho a pedido de minha avó, rodeado por musgo verdadeiro, que minha mãe comprava no Mercado da Ribeira (o tal da novela Laços de Sangue).
No dia 24 antes de deitar, eu e meu irmão ir-mos muito respeitosamente por os sapatinhos na chaminé enfeitada com papel prata, para o Menino Jesus colocar no dia seguinte os seus presentes, sempre com a nossa promessa, ajoelhados, qual altar, de nos portar-mos melhor, comer tudo e não atentar a avó São, no novo ano esperado.
Já na minha própria casa, fiz por manter tudo como na meninice, e há mais de trinta anos, a família reúne-se e vive a época da melhor maneira.
À grande obreira Alda, que se “esfalfa” em trabalhos e pormenores para que todos os muito convivas, sintam a alegria da quadra.
O meu apreço e admiração, pelo seu génio decorativo, culinário e logístico.
Na mesa as cadeiras tem vindo a reduzir-se. Pela ordem natural da vida os que partiram, são já mais do que os que nasceram, mas a vida continua, e todos são lembrados.
“Só se morre quando já não se é recordada”
Não sei nem posso realçar um único dos meus Natais, por de todos ter muito gratas recordações.
Substituindo-me, e de forma superior, deixo-vos um dos mais belos poemas de um homem que enriqueceu como muito poucos, a nossa língua com magistrais palavras, Ary dos Santos :
-
Natal, é Quando um Homem quiser
Tu que dormes à noite na calçada do relento
Numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
Tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
És meu irmão amigo
És meu irmão
E tu que dormes só no pesadelo do ciúme
Numa cama de raiva com lençóis feitos de lume
E sofres o Natal da solidão sem um queixume
És meu irmão amigo
És meu irmão
Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nama vida a amanhecer
que há no ventre da Mulher
Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
Tu que inventas bonecas e combóios de luar
E mentes ao teu filho por não os poderes comprar
És meu irmão amigo
És meu irmão
E tu que vês na montra a tua fome que eu não sei
Fatias de tristeza em cada alegre bolo-rei
Pões um sabor amargo em cada doce que eu comprei
És meu irmão amigo
És meu irmão
Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher
 Ary dos Santos
-
José Justo