HÁ DISTANCIA DE 40 ANOS NUM DOMINGO À TARDE
Reza o dicionário que uma vila é um aglomerado populacional de tamanho intermédio entre a aldeia e a cidade, dotado de uma economia em que o sector terciário (comércio e serviços) tem uma importância no mínimo razoável e, pelo menos, 1.000 habitantes.
Quando “passei” pelo continente africano, no local onde permaneci, as coisas não se apresentavam exactamente assim: a “vila” era constituída por 3 “aldeias”, (uma a norte, outra a sul, compostas por naturais, a terceira ao centro, composta por europeus). Penso que não continha um tal número de habitantes, ao todo, por excesso, uns 500. Os estabelecimentos de comércio e serviços eram só dois, diferentes na grandeza, dispersas umas tantas “tascas”. Á data dava (creio que ainda) pelo nome de Tite, ficando
para uma outra ocasião a descrição e o interesse, que foi grande, desta “vila” no campo histórico, na área económica e no plano estratégico/militar.
A historieta que vou relatar, decorreu no ano de 1968, em dia de domingo, não tendo outro objectivo, senão a “cusquisse”, e registar o acontecimento algo “explosivo”, numa das “aldeia” onde a casta era bem vincada, transmitida pela hereditariedade em termos físicos e comportamentais, de tal forma que corria o risco em ser preso, despromovido e excomungado quem ousava pô-la, a dita casta, em causa.
Em termos de enquadramento, refiro, por exemplo, que aos domingos, as mulheres sentavam-se na frente das suas palhotas vestidas com “panos” endomingados, limpos, com olhares atentos nos seus rebentos e nos animais domésticos que possuíam, cavaqueando ora com vizinhas ora com visitas, sempre sorridentes ou gargalhando forte, chamando para si a atenção de quem passasse, fossem indivíduos brancos ou pretos. A única, mas formosa, branca existente estava sempre “escondida” durante os dias úteis da semana por afazeres profissionais, para com os nativos, no posto comercial que detinha, mas aos domingos fazia exactamente o mesmo, era um encanto vê-la sorridente para todos, esmeradamente vestida, penteada e pintada no período que dispensava, no servir, no bar, as encomendas da rapaziada.
As bajudas, essas, andavam em grupo pelas “avenidas” da tabanca, ou cavaqueando concentradas junto à “casa da água”, mostrando na sua passagem o que de mais bonito possuíam – os seios – fazendo propositadamente olhares de “provocação” típicos da sua jovialidade. Os homens passeavam vestidos do que de melhor tinham para se mostrarem diferentes ao resto dos dias e quiçá vaidosos. Alguns preferiam passar o dia a “enfrascarem-se” em aguardente de “cana”, ou em cerveja, num ritual e objectivos comuns não só pelo prazer da deglutição, mas também por algo másculo.
Aos domingos corria tudo na “perfeição”, inclusive as flagelações do IN também não existiam, quando subitamente, na “3ª aldeia”, a estorvar todos estes momentos prazenteiros, alguém em surdina, mas suficientemente audível para um grupo de “castrenses” que se encontravam para os lados da “porta d’armas”, exclamou: …Os gajos beijaram-se…Os gajos beijaram-se!
Foi muito complicado abafar tal burburinho! Já tinha sido noticia de “primeira página” o que se passou numa das messes, com uma breve “paixoneta”. A “sopa” não se entornou porque foi imediatamente “agarrada”. Mas os acontecimentos com o chocho na porta d’armas foram bem diferentes, por incompreendido e ao mesmo tempo delicado pelas consequências que poderiam advir para os protagonistas.
Mas não se pense que tinha sido “descoberta a pólvora em Tite”, já na Antiguidade também era comum, para gregos e romanos, o beijo entre guerreiros no retorno dos combates. Era uma espécie de prova de reconhecimento. Aliás, os gregos adoravam beijar. Mas foram os romanos que difundiram a prática. Creio que o problema existiu porque a beijoca não tinha sido dada após decorrido qualquer combate com o IN, nem os intervenientes eram propriamente guerreiros!
Que raio, há “distancia de 40 anos”, presumo tal “burburinho” se deveu mais a esta razão do que por outra qualquer”. Para além disso, era domingo!
Pica Sinos
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