Lavadeira do José da Costa
Com a recente luta no país dos pequenos e médios empresários camionistas tendo em vista a redução dos encargos, fundamentalmente com o dos combustíveis, surgiu-me uma vaga ideia de que, há época, também houve problemas com os combustíveis em Tite. Sonhei ou creio ter ouvido falar que uns bidões de gasóleo desapareciam (?) nos dias em que um comerciante se oferecia para quartos de sentinela perto do local onde o arame farpado estava disfarçadamente cortado.
Bom, como a esmagadora maioria do pessoal não tinha necessidade do gasóleo, não tinham carros para atestar, a não ser o dito cujo comerciante, não é desta cena que vos quero recordar, mas sim das “lavadeiras” de Tite.
Como estão recordados, as chamadas “lavadeiras” de Tite, ao pessoal que estava de “passagem” por aquelas bandas, desde que contratadas obviamente, lavavam mas também engomavam, emendavam ou cosiam o vestuário que lhes entregavam sobretudo fardamento militar. Algumas das “lavadeiras” de Tite faziam muito mais que isto. São outras histórias que, para agora, creio, também, já não interessam.
A palhoça da minha lavadeira estava situada na direcção da tasca do branco Silva, ou seja, na área da tabanca dos indígenas de etnia fula. A Maimunda era casada, o seu pai era o chefe da tabanca o marido agricultor, tinha três filhos, dois rapazes e uma rapariga, onde o mais velho, que estava em casa de familiares em Bissau, era estudante. Dava para perceber que os restantes, logo que tivessem idade, lhes seguiriam o mesmo caminho. Tinha um número considerável de “fregueses”, por isso pouco trabalhava no campo, estas tarefas eram imputadas a outras duas mulheres mais novas, também casadas com o seu marido de quem já tinham filhos de “colo”, servindo de aia ás suas companheiras na “vivenda”.
Cá para o rapaz, quando não dormia na cama de lona existente à porta da palhoça, segurada por dois dos prumos que sustentavam o tecto, a “minha” lavadeira, tinha comigo momentos de conversa muito interessantes que só anos mais tarde os vim a perceber em toda a sua plenitude estando-lhe grato pela simpatia que ela e sua família me dispensaram.
Um dia, recordo, no conjunto familiar, depois de almoçarmos, estava uma mulher que nunca antes avistara, que ao mostrar-lhe fotografias, que comigo levara onde me retratava com a minha namorada no interior de um automóvel que disse ser meu, na verdade não era, perguntou-me fixando bem a minha face,
“Diz-me qual é a razão da vossa presença neste país?”
Estamos aqui para vos defender, disse convicto.
Não me pareceu satisfeita com a resposta.
Com os olhos rasos de água, retorquiu: “Já pensaste que se não vos mandassem para cá não existia esta guerra, que os nossos rapazes não eram forçados a combater-vos, que os nossos haveres e produtos agrícolas não era roubados quer por uns quer por outros?”
Fiquei incomodado. Mais tarde vim a saber que era professora primária em Bissau.
E o que penso eu disso já há largos anos?
Minha querida professora primária, continuo sem saber quem tu és, sabes uma coisa…. Tinhas toda a razão.
Pica Sinos
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