BISSASSEMA
As horas que se seguiram após o rapto dos nossos
companheiros da CART 1743, em Bissásema, naquela trágica madrugada de 2/3 de
Fevereiro de 1968, foram de extrema preocupação para todos os militares
sediados em Tite, sem sabermos o que lhes teria acontecido, se estavam vivos ou
maltratados.
Já muito se tem escrito sobre este trágico acontecimento
militar na Guiné, mas nunca é demais relembrar o que aconteceu e homenagear
aqueles que tanto sofreram.
Damos de seguida o testemunho do "Oficial de Dia"
em Tite, nesse dia 3 de Fevereiro, alf Augusto Antunes, já publicado neste
facebook, e também no blog bart1914.blogspot.com bem como no Livro de Memórias do BART 1914.
Após este relato de hoje, iremos também publicar testemunhos
dos três companheiros raptados - alf. Rosa, Contino e Capitulo.
Queremos ainda lembrar a morte em combate nessa noite
trágica, de dois companheiros - furriel Cardoso do Pelotão de Morteiros e
Sargento Milicia Manga Colubali.
De realçar ainda que o IN sempre ocultou até hoje, as perdas
humanas e de material que teve nos dias seguintes, em que sistematicamente
flagelou o destacamento de Bissássema, sem no entanto ter obtido êxito.
Um abraço ao alf. Augusto Antunes.
"Bissássema, o desastre - Memórias do Oficial de Dia...
"Memórias do Bart 1914 em terras da Guiné.
Um dia difícil de
descrever, mas para sempre recordar
Estávamos nos primeiros dias de Fevereiro de 1968. Um dia ou
dois antes, tinhamos tido a visita do Conjunto Académico João Paulo, um
conjunto de rapazes madeirenses muito apreciado na época, pelas suas músicas
que ficavam no ouvido da malta jovem.
Por essa altura os altos comandos do C.T.I.G., resolvem
fazer uma operação de limpeza e ocupação da tabanca de Bissássema, por constar,
devido a informações chegadas ás chefias, que os homens do PAIGC andavam por
ali a impôr as suas ideias e isso tornava-se deveras perigoso não só para Tite,
mas até para Bissau.
Assim, o comando do BART 1914 resolve desencadear uma
operação, já com alguma envergadura, convocando um vasto grupo de soldados,
cujo número não posso precisar ( talvez 70 ou 80 homens) onde estava um pelotão
da CART 1743 e dois pelotões de milícias, um de Tite e outro de Empada, mais
alguns homens do Pel. de Morteiros e das Transmissões, tendo como comadante o
saudoso Alferes António Júlio Rosa, (com pouco mais de 1 mês de comissão, pois
tinha chegado á Guiné em meados de Dezembro, do ano anterior) para não só
ocuparem a tabanca, mas também construir abrigos, para lá colocar em
permanência uma força militar para defesa da mesma.
A nossa tropa sai de Tite, salvo erro no dia 1/2/1968, ocupa
a tabanca sem qualquer resistência e começa de imediato a construção dos
abrigos previstos para aquele fim. Na noite de 2 para 3 de Fevereiro, estava eu
de oficial de dia ao BART, ouvem-se fortes rebentamentos, para os lados da
tabanca de Bissássema, que indiciavam que o pior podia estar a acontecer.
Tentámos contactos com a nossa tropa, via rádio, mas não tivemos qualquer
êxito. Ninguém nos ouvia e muito menos respondia. Meia hora depois o tiroteio
parecia ter acabado. Foi esperança de pouca dura, pois logo a seguir começou um
novo ataque, vindo mais tarde a saber que o IN tinha entrado pela tabanca
dentro, lançando granadas e semeando o pânico. Abalado com a explosão de uma
granada o Alferes Júlio Rosa e vários soldados foram apanhados á mão, levando o
IN também algum material de transmissões.
Aquela noite foi de uma angústia terrível, sem termos
notícias do que se estaria a passar. A tropa que tinha ficado em Tite, ficou
toda a noite em estado de alerta máximo, ávida por ter notícias, mas também não
fosse o IN aproveitar a ocasião, para
atacar o aquartelamento.
Com o amanhecer e aparecimento da luz do dia, começaram a
chegar ao aquartelamento de Tite alguns dos nossos soldados, lavados em
lágrimas, alguns esfarrapados outros semi-nus, uns com armas, outros sem nada
nas mãos, dando a todos os que os viram chegar uma imagem fiel e terrível do
sofrimento, por que tinham acabado de passar. Gostaria de mencionar o nome de
todos os nossos homens feitos prisioneiros, mas para além do já citado Alferes
Júlio Rosa recordo também o furriel miliciano do Pelotão de Morteiros 1208 de
seu nome Manuel Nunes Reis Cardoso, o 2º sargento da Companhia de Milícias nº
7, Manga Colubali e mais 3 militares da CART 1743 o Rosa, o Capítulo e o
Contino. Que me desculpem se faltam alguns, mas a minha memória já não dá para
mais.
Apenas e para terminar este meu pequeno texto dir-vos-ei,
que naquela altura chorei e muito e a imgem que tenho guardada na minha
memória, irá comigo para a cova, quando o Senhor entender, que chegou a minha
hora.
Ainda hoje sinto uma estranha sensação, ao recordar estes
acontecimentos.
Para registo, este foi um dos piores momentos por que passei
naquela terra.
Para todos vós um grande abraço de amizade e o grande
orgulho de vos ter tido por companheiros e camaradas daquelas campanhas.
Augusto Antunes
Alferes Miliciano"
Oficial de Dia, no dia 3/2/1968antossilva@gmail.com
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Comentários no Facebook, acerca deste artigo.:
Amadeu Contige
Obrigado Alfreres Antunes pela recordação abraços amigo
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Raul Dutra Goulart
Pertencia ao 1º pelotão da Cart.1743,(Furriel Miliciano),e
fomos nós que em1º lugar estivemos em Bissasema,com Milícias,e com a missão de
ocupar o espaço, construindo abrigos. Fomos substituídos pelo pelotão do Meu
Grande Amigo, Alferes Rosa, e ao chegar ao aquartelamento de Tite, informei os
meus superiores, que discordava, de ficar só um pelotão, e os milícias, a maior
parte, tinham a mauser. Passados uns dias aconteceu o referido pelo Alferes
Antunes, precisamente o IN, concentrou o fogo sobre os Milícias, que não
conseguiram aguentar, fugiram, e deu-se a invasão, fuga e prisões. Foi também o
meu pelotão mais as Milícias, e outra companhia, que saímos em socorro dos
nossos Camaradas, e ocupamos o terreno. Foi um choque grande, com tudo o que se
passou. Fomos também atacados, mas ressistimos. São estas e outras imagens, que
estão nas nossas memórias, até ao fim das Nossas Vidas, que muitos não
Respeitam.
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Bart Tite - Guiné
Raul Dutra Goulart é verdade amigo, até ao fim das nossas
vidas. Abraço. Vamos continuar a publicar os depoimentos dos três prisioneiros
da tua companhia. Abraço. LG.
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