A FUGA
Há coisas que não podemos deixar cair em saco rôto, para que os vindouros
saibam o que foi a guerra do Ultramar, principalmente os factos que nos foram
mais próximos.
Relembro aqui dois excertos do livro MEMÓRIAS DE UM
PRISIONEIRO DE GUERRA (pag. 109), da autoria do saudoso Alferes António Júlio
Rosa, da CART 1743, em que ele relata (edição de 2003), uma tentativa de Fuga
de alguns companheiros de infortúnio entre eles o major piloto aviador António
Lobato, recentemente falecido, dos calabouços da Guiné Conakry em 1969, um ano
e um mês depois do desastre de Bissássema.
“Na tarde do dia 3 de março de 1969, estava bastante nervoso.
Havia o receio de que alguma coisa corresse mal e que o plano falhasse. No caso
de isso acontecer, tudo se complicaria e todos deixariam de confiar em nós. De
qualquer modo, era meu dever arriscar. E foi isso que fiz. Se fosse hoje, a
minha decisão seria idêntica àquela.
Às dezoito horas eu e o Vaz estávamos preparados!... Tínhamos
a chave e o elo. O Lobato ocupou a posição estratégica, no corredor da cela dos
“intelectuais”. O Vaz subiu para o depósito sem problemas!... A seguir era a
minha vez!... Olhei para o meu companheiro!... Tudo estava normal!... Em poucos
segundos também eu estava no interior do depósito. A nossa sorte estava
lançada!...
Teríamos de esperar cerca de quarenta e cinco minutos pelo
nosso camarada Lobato. Quando subi, tive tempo de observar o exterior da prisão.Havia
poucas casas, algumas árvores e não vi ninguém nas redondezas.
Aquele espaço de tempo pareceu-nos uma eternidade!... Por
fim, ouviu-se um leve ruído nas colunas, e logo de seguida, surgiu a cabeça do
Lobato, que, rapidamente saltou para dentro do depósito, onde ficámos os três,
sentados no fundo do nosso esconderijo. Ninguém se apercebera do desenrolar da
primeira acção. Estava tudo a correr bem!...
…………..
O Lobato disse-nos então que não tinha comido e que despejara
o arroz do jantar num balde. Dizia ele que os nervos eram tantos que até tinha
perdido o apetite!... Por fim a porta foi fechada no momento em que a noite
começava a cair.
……………
Embrenhamo-nos
no mato e (passados alguns dias), e decorridos dois quilómetros, a vegetação
fez-nos regressar à estrada. Não fizemos mais de cem metros quando, de um lado
e do outro da mata, se acenderam lanternas eléctricas. Fiquei sem ver, com
tamanho luzeiro e, nos segundos imediatos, senti-me agarrado… Um fio metálico
aflorou à minha garganta… era uma catana encostada ao meu pescoço!... Os meus
companheiros também estavam imobilizados. Tínhamos sido capturados!...
……………………
A LUZ AO
FUNDO DO TÚNEL… A LIBERDADE!... (pag. 149)
(Após a libertação a 21 de Novembro de 1970) Caminhámos durante quinhentos metros, até que chegámos à praia!... No areal só restavam dois barcos de borracha!... Os outros já tinham partido!... O comandante do grupo de assalto comunicava com o rádio. Ouvi o que ele disse: Libertámo-los todos!... Missão cumprida!...”
Grupo de Prisioneiros após a libertação
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