Tristes memórias…
BISSÁSSEMA – 3
DE FEVEREIRO DE 1968
Há 53 anos, de
madrugada, a caminho de Bissássema para socorrer, ingloriamente, um pelotão da
CArt 1743 e dois pelotões de Milícias.
À CCAÇ. 2314,
fora ordenado para se deslocar de Tite para BISSÁSSEMA a fim de socorrer as NT
que se encontravam nessa tabanca. À chegada, verificou-se que a enorme tabanca
estava praticamente abandonada, sem militares, sem forças do PAIGC e sem
população.
Num forte
ataque, o PAIGC penetrou no dispositivo de defesa, lançando granadas e semeando
o pânico. Em consequência do forte flagelação, o PAIGC expulsou a forças
existentes e fez prisioneiros o Alferes António Rosa e mais dois seus
militares, cabo cripto Geraldino Marques
Contino e soldado Victor Manuel Jesus Capitulo, da CArt. 1743 e os restantes
puseram-se em debandada para salvar a vida. Na retirada ficaram desaparecidos
um furriel e um sargento e este, mais tarde, foi encontrado morto no rio Geba.
Foi dada ordem
a esta Companhia para guarnecer BISSÁSSEMA a fim de proteger a população, onde
permaneceu até 13 de Março e abandonar a tabanca.
Sobre essa
noite fatídica de Bissássema no seu
livro 'Memórias de um prisoneiro de guerra", alferes miliciano António
Júlio Rosa, relata-nos:
"Seria meia-noite, quando, quem estava já
dormindo, e era o meu caso, foi despertado violentamente!... Os 'turras'
estavam a atacar!... Ouviam-se rebentamentos e muitas rajadas. Era um fogo
contínuo e feroz. O ataque tinha sido desencadeado, a sul, no lado da mata...
Estavam lá os africanos de Tite e alguns de Empada. O tiroteio manteve-se muito
intenso durante cerca de meia hora. Depois... diminuiu até cessar
completamente.
Quando o
tiroteio acabou, ficámos convencidos de que o ataque tinha sido repelido.
Contactei o Maciel para darmos uma volta pelos abrigos e ver se tudo estava
bem. Deslocámo-nos até ao último abrigo do meu pelotão, situado a uns cinquenta
metros e verificámos que tudo estava normal.
Íamos
prosseguir a nossa ronda para sabermos dos africanos, quando, a uns cinquenta
metros, se ouviu uma rajada de pistola-metralhadora. O som parecia vir de
dentro do nosso perímetro. Ficámos os dois perplexos porque não tínhamos armas
que “cantassem” assim!... Regressámos de imediato, à zona do comando e
alertámos para a possibilidade do inimigo se achar no meio das nossas forças.
Dentro do posto de comando encontrava-me eu, o Maciel, o Cardoso, o Gomes e
três operadores das transmissões. De repente, apareceu, transtornado, o
comandante da milícia de Tite. Só teve tempo de nos dizer que os ‘turras’
estavam dentro do perímetro e se dirigiam para o local onde nos encontrávamos.
Mal acabou de falar fomos atacados. Não deu sequer tempo para se tentar encontrar
uma solução!...
Rapidamente,
procurámos sair para o exterior. Quando cheguei à porta, seguido pelo Geraldino
e pelo Capitulo, rebentou uma granada ofensiva mesmo à nossa frente. Com o
sopro da explosão fui empurrado para trás e não via nada pois tinha os olhos
cheios de terra. Com o estrondo, fiquei surdo!...
Foi uma
sensação horrível!... Pensei que ia morrer!... Foi impressão instantânea que
passou em segundos. Entretanto, tive outra sensação!... Tive o pressentimento
que ia ser abatido!... Sinceramente fiquei preparado para morrer!...
… Senti-me
agarrado, ao mesmo tempo que alguém me socava, violentamente, mas não sentia
qualquer dor. Estava prisioneiro!... O Dino e o Capitulo tiveram a mesma
‘sorte’!... Seriamos levados para Conakry…”
Sabe-se que
esta intervenção, foi um fracasso para ambos os lados que o PAIGC sempre
ocultou no seu historial. Se pelo lado português, para além dos prisioneiros e
dois desaparecidos e feridos não se conseguiu concretizar os objetivos
propostos; para o lado do PAICG, o elevado números de baixas, levou a que
sempre escondesse as suas consequências tendo, inclusivamente, ter sido
considerado por alguns, como um dos maior desaires que sofreu no seu movimento
de libertação da Guiné.
Eles não
merecem ser esquecidos, cumpriram com o seu dever para com a Pátria!
3 de Fevereiro
de 2021.
Cor. Pais Trabulo
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