21 de JULHO - DIA
da ARMA de CAVALARIA e as
RABANADAS têm algo em comum?. Aparentemente não, mas será conveniente ler o
texto que se segue.
Prestei serviço militar na Guiné de 01/03/1969 a 22/12/1970
integrado numa companhia de Cavalaria, a 2483 denominada por CAVALEIROS DE NOVA
SINTRA, que pertencia ao BCAV 2867 sediado em Tite.
O dia 21/07/70 foi passado no mato, em Nova Sintra e esteve
efectivamente ligado às rabanadas. Isto porque no reabastecimento mensal de
géneros frescos, que só davam para três dias, sobraram algumas dúzias de ovos,
poucas, que não davam sequer para meio ovo por militar, numa refeição. Para que
os ovos fossem repartidos igualmente por todos (uma companhia tem mais ou menos
160 homens), resolvi mandar fazer rabanadas e desta forma comemorar a data
festiva do Dia da Cavalaria, tanto mais que eu fazia nesse dia 24 anos.
O padeiro, o José Manuel Bicho, teve um trabalho extra ao
fazer o pão, tipo cacete e os homens da cozinha, o Gonçalves e o Gonzaga,
auxiliados pelos seus ajudantes, deram início à "Operação Rabanada".
As fatias de pão estiveram de molho no vinho tinto, como convém e depois
embebidas no ovo batido.
Na cozinha ao ar livre iniciou-se então à fritura das ditas. Deviam ser uma três da tarde, mas o pessoal juntou-se e não arredou pé, à volta das fritadeiras, lambendo os lábios só com o cheiro da iguaria.
Mas de repente tudo mudou. Os rapazes do PAIGC vieram
participar na festa, dando início a uma flagelação (ataque) ao quartel, a uma
hora não muito habitual, porque era no final do dia que costumavam atacar.
Ouvidos os primeiros tiros da célebre arma automática e por todos conhecida
como "costureirinha", pois tinha um matraquear parecido com uma
máquina de costura, bem como o som caractristíco da saída das granadas do
morteiro 81 e do canhão sem recuo, disparadas longe do arame farpado, os
esfomeados bateram em retirada, procurando refúgio nos abrigos e nas valas onde,
por vezes, resultava numas equimoses na cabeça e uns arranhões nos braços.
Na ânsia da fuga, bateram com as pernas nas pegas compridas
das fritadeiras, tombando-as, originando
que o petisco caísse no pó do chão de terra da cozinha. Durante a flagelação ouviam-se
as granadas das armas pesadas do PAIGC a silvar o céu, cruzando todo o
aquartelamento, indo rebentar com estrondo na bolanha, fora do arame farpado.
Contrariamente a outras flagelações, desta vez não acertaram no alvo. Foi um
susto que durou perto de dez minutos, não tendo havido feridos ou danos
materiais.
Passada a tempestade veio a bonança, com a malta a regressar
ao local do crime (junto das fritadeiras). Só que rabanadas limpas e
comestíveis havia muito poucas, porque a grande maioria ficou polvilhada de pó
da terra, parecendo canela e até esmagadas devido à debandada. Mas ainda assim
os mais gulosos e corajosos, pegaram nas rabanadas e com todo o cuidado tiraram
a terra envolvente e com meia dúzia de sopradelas, passaram a ter um petisco
delicioso, sempre acompanhado por uma ou mais garrafas de cerveja de 0,66.
Terminada a festa, foi tempo de tomar banho e aguardar as cinco da tarde para o
jantar. Findo este, o pessoal ficava na conversa à porta dos abrigos, prontos
para o que desse e viesse, por vezes sob o magnífico luar africano, contando
anedotas ou discutindo os jogos de futebol e obviamente escrevendo à família,
aos amigos, às namoradas e às madrinhas de guerra. Como curiosidade refiro que
o Dia da Cavalaria a nível do Batalhão, foi celebrado em Jabadá, onde se
encontravam os amigos da Ccavª. 2484, os Dragões de Jabadá.
"Os Cavaleiros de Nova Sintra"
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