O TROMBALAZANAS E OS
MIUDOS DO MEU VELHO BAIRRO DAS FURNAS
…Direi
mesmo que, dada a existente “familiaridade”, era fácil brincar e promover
pequenas provocações, sobretudo com os primatas…
…Não
era preocupante para a família, por umas horas, a ausência do(s) seu(s)
rapaz(es)...
… À
2ª feira, o dia estava reservado para faltar à escola…
…Durou
até que o guarda, híper zangado por lhe baixarem o “salário”, nos descobriu.
Estou
seguro que, nos dias de hoje, as crianças com as idades compreendidas entre os
7 e os 13 anos, não têm as mesmas oportunidades na frequência, que, os miúdos
do meu velho bairro das Furnas tiveram, no mesmo espaço da idade, quando das
idas ao Jardim Zoológico.
São muito evidentes, os diferentes propósitos, se confrontados
com o passado.
Ainda
bem.
Actualmente
as crianças, com as suas visitas ao Zoo, têm mais possibilidades de conhecer, em
profundidade, toda a raridade do mundo animal, seus usos e costumes.
São-lhes
indicados os longínquos países e, os seus verdadeiros habitats.
São
acompanhados frequentemente com os familiares, professores, animadores
culturais, etc.
Apadrinham
animais, conversam e trocam opiniões com os tratadores.
Brincam
com outras variedades de brinquedos.
Tudo é
mais dinâmico do ponto de vista recreativo, cultural, educativo e ecológico.
Para
nós, miúdos do velho bairro, o “Jaleco”, também fazia parte da nossa vida! Até
de noite, já deitados, metia-nos respeito ouvir, quando o vento de feição, o
rugir dos leões, o uivar dos lobos, o “chorar” das hienas ou o cantar dos
pavões.
Sabíamos
dos espécimes de animais existentes na sua vida de cativeiro.
Prontamente
visitávamos os novos “habitantes”. Direi mesmo que, dada a existente “familiaridade”,
era fácil brincar e promover pequenas provocações, sobretudo com os primatas.
Chamávamos
os animais pelo nome que lhes era dado. Mas estávamos longe das explicações de
zoologia, biologia e dos impactos que, hoje, aos miúdos é facultado.
Habituados que estávamos à “rua”, não constituía problema a
distância entre o velho bairro e o jardim. Também não era preocupante para a
família, por umas horas, a ausência do(s) seu(s) rapaz(es).
Vejo-me
descer até meio da Rua das Furnas.
Vejo-me
descer as escadas do muro da meia laranja e, minha frente verificar a majestosa
entrada do jardim, ladeada por 2 lindas torres.
Descer a
Travessa de S. Domingos de Benfica, era a alternativa. Á direita encontrávamos
o Convento Franciscano de Santo António da Convalescença,
que veio a albergar Escola Comercial de Pedro de Santarém.
O “jaleco”
era vedado (é), por um gradeamento em ferro, na vertical, no feitio de lança (caçadores
zulus?) que, distavam entre si 20cm a 25cm.
Este
gradeamento estava pintado de verde (é). Acompanhava a Estrada de Benfica,
desde as traseiras do Chafariz das Aguas-Boas, passava por Sete-Rios e, acabava
no Jardim das Laranjeiras, em Palma.
Conta-me
o Artur Amorim (o ti jaquina), da rua dos Salgueiros que, por vezes, à 2ª feira,
o dia estava reservado para faltar à escola.
A ideia era ir ao encontro de um “familiar” muito especial. O
trombalazanas como lhe chamava, no filme “Chapéus há muitos”, o Vasco Santana.
No
caminho, manhã cedo, muito antes da abertura oficial, depois de se certificarem
não haver guardas à vista, ele e, mais 2, infiltravam-se no “jaleco” pelo
gradeamento – o Bica, da rua dos Plátanos, por gorduchito, depois de enfiada a
cabeça, o corpo era empurrado –.
Progrediam
no caminho, nada lhes importando os olhares efetuosos das diferentes espécies animalescas.
O dia
era para usufruir dos “benefícios” das “transações monetárias.
Ou
seja:
Para
satisfação da população visitante, certamente para suporte das despesas da sua alimentação,
o elefante, terá sido ensinado, a troco de uma moeda de 1 escudo, acionar um
sino, preso numa parede na altura de 3 metros, tendo fixa uma corrente, com
larga argola, onde enfiava a tromba e o fazia tocar.
Todas
as moedas que não se ajustassem, a 1 escudo, eram rejeitadas pelo animal, mesmo
aquelas de valor superior.
Porquê à
2ª feira? Pergunto!
…Porque era o dia a seguir aquele que, mais
visitantes, o elefante tinha tido...
Assim:
…Enquanto eu, (diz o Ti Jaquina-Artur), mostrava uma moeda de 1 escudo ao elefante,
possibilitava ao Bica e, ao Fernando Batista, da rua das Tílias saltar, sem
medos, para a arena, com vistas a apanhar todas as moedas que, o trombalazanas,
rejeitara.
…Durou até que o tratador e guarda, híper
zangado por lhe baixarmos o “salário”, nos descobriu.
…Depois disso, a correria, a fugir do
tratador, foi muita até ao jardim, mas….das Furnas...
Tirando a “aventura” atrás relatada, já foi referido que, o
dia privilegiado da presença da rapaziada no Jardim Zoológico, eram os domingos.
Nestes
dias, no chamado jardim dos pequeninos, desenvolviam-se jogos de diversas
modalidades:
Corrida
de sacos, salto à bolacha, corrida livre (50m), etc.
Também
se brincava nas minúsculas casinhas ainda hoje existentes.
Aliás, para
obviar a rapaziada entrar pelas grades que, acontecia com alguma frequência,
participávamos sempre nos jogos, então promovidos por um existente animador.
Com as
melhores classificações obtinha-se, como prémio, ingressos grátis para a semana
seguinte.
Outros,
ainda tinham a oportunidade, quando o vigilante se distraía ou na ausência do
mesmo, de usufruir de outros “prémios”, sobretudo os ovos dos cócós que, nos
ninhos, por detrás das pequenas casinhas, abundavam. Ou ainda, “chinchar” nas laranjas
e nas maças dependuradas nas árvores de frutos que, por perto estavam
plantadas.
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