Com a devida vénia aqui se reproduz na integra o artigo da jornalista Teresa Firmino
Publicado no Jornal “O Público” em 15/Nov/2009
Guerra colonial: Recuperação dos restos mortais de soldados portugueses
Missão na Guiné-Bissau para exumar corpos de militares
15.11.2009 - 08:24 Por Teresa Firmino
Peritos vão deslocar-se a vários sítios para localizar e identificar combatentes mortos e enterrados em cemitérios africanos
A missão da Liga dos Combatentes dirige-se para o sul da Guiné-Bissau: Bolama (na foto), Fulacunda, Bedanda, Cacine, Catió, Quebo e ilha das Galinhas.
Chama-se Operação Sul da Guiné, e a razão é óbvia: os sete locais que serão visitados numa missão da Liga dos Combatentes, com partida marcada para hoje, localizam-se todos nessa região da Guiné-Bissau: Bolama, Fulacunda, Bedanda, Cacine, Catió, Quebo e ilha das Galinhas.
O objectivo é continuar o trabalho de localização, identificação e levantamento dos corpos de militares mortos durante a guerra colonial, iniciado há alguns anos. Depois da ida para o terreno da equipa de missão, chefiada pelo major-general Fernando Aguda, vice-presidente da Liga dos Combatentes, seguirá a 20 de Novembro a equipa científica, coordenada pela antropóloga forense Eugénia Cunha, da Faculdade de Ciências da Universidade de Coimbra e colaboradora do Instituto Nacional de Medicina Legal. Será a quarta ida à Guiné-Bissau, para localizar e identificar militares mortos.Primeiro, foi Guidage, no Norte do país, em Março de 2008.
Nesta pequena povoação, junto à fronteira com o Senegal, situava-se um cemitério militar provisório. Com o passar do tempo, os sinais exteriores de que ali se encontram sepulturas foram desaparecendo.
Num levantamento prévio, a Liga dos Combatentes referenciou a existência de sepulturas em Guidage, até porque havia um croquis, de 1973, que assinalava o local de várias campas. Conseguiram localizar-se os restos mortais de 11 militares, alguns de origem africana.Depois, veio a missão em Farim, também perto do Senegal, em Dezembro de 2008. Seguiu-se Gabú, no Nordeste do país, já em Março deste ano. Nestes dois locais, encontraram-se os restos mortais de 44 militares, oriundos tanto da então metrópole como recrutados localmente, segundo informações do tenente-general Joaquim Chito Rodrigues, presidente da Liga dos Combatentes.Oito trasladações Na sequência das três missões na Guiné-Bissau, os restos mortais de alguns militares foram identificados.
Até ao momento, houve oito trasladações para Portugal, por vontade das famílias. Entre os militares cujos restos mortais já foram transferidos encontram-se três pára-quedistas sepultados em Guidage: António Vitoriano, Manuel Peixoto e José Lourenço. Vieram no ano passado. Eugénia Cunha conta que estas identificações se basearam em características antropológicas: fracturas de ossos antigas (de que as famílias tinham registo) e comparação das características do crânio com fotografias, em que foi possível ver a dentição e o perfil facial."
A identificação é sobretudo por comparação. Comparamos os dados post-mortem com os dados ante-mortem. Se houver coincidência, isso permite fazer uma identificação positiva", explica a antropóloga forense. A dificuldade é que, nestes casos, os militares têm idade (20 e poucos anos) e estatura semelhantes. "São os dados faciais e características particulares na dentição que vão ajudar à identificação."Seguiu-se a vinda dos restos mortais de outros dois militares, cujos funerais tiveram lugar em Maio último.
Originalmente sepultados no Cemitério de Bissau, já estavam identificados: José Duarte e João Lourenço, ambos primeiros-cabos. Agora, chegaram os restos mortais de outros três militares que ontem foram homenageados no Monumento dos Combatentes do Ultramar (junto ao Forte do Bom Sucesso, em Lisboa). Morreram em Guidage. Trata-se do furriel José Machado, do soldado Manuel Geraldes (cujos funerais serão no dia 15) e do primeiro-cabo Gabriel Telo (funeral será a 22).
Ainda não foi possível fazer a identificação dos militares de Farim e Gabu, ainda por falta de elementos de comparação. A equipa científica necessita de dados disponibilizados pelas famílias, desde amostras de ADN até a informações sobre as pessoas enterradas - fracturas e lesões em vida ou características dentárias.Houve ainda outros destinos para os 55 corpos levantados durante as três missões na Guiné-Bissau: alguns ficaram sepultados em cemitérios locais e outros foram levados para o Cemitério de Bissau.
Espalhados pelo país, encontrar-se-ão 746 militares que combateram durante a guerra colonial na Guiné (1963 -1974). Alguns foram dados como desaparecidos, outros nem sequer se conhece onde foram enterrados.
Foto: Paulo Ricca
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