domingo, 21 de agosto de 2022

Vitor Barros - a homenagem do Pica Sinos.

 OLHAI PARA ESTAS MÃOS QUE AQUI VÊDES, JÁ FORAM PEQUENINAS E FORMOSAS, LEVES E MACIAS COMO LIRIOS, ROSADAS E FRESCAS COMO ROSAS.

DECLAMOU EM ALMOÇO FESTIVO O EX-OPERADOR DE TRANSMISSÕES DE INFANTARIA E OPERARIO VIDREIRO DE PROFISSÃO  


Não posso deixar de recordar o Vítor Barros. Nosso camarada d’armas na guerra colonial e operário vidreiro de profissão. Era um homem bom ao contrário do frágil vidro que trabalhava. Era um homem forte, educado, afável e gentil. Um amigo de pronto a dar o seu ombro para chorarmos nos momentos menos bons, escutar e partilhar as vivências contemporâneas e passadas.

Um dia, no final da tarde, sentados junto à porta do CC, recordo este homem bom, mobilizado para a guerra na Guiné como primeiro-cabo de transmissões de infantaria a lamentar-se pela falta de equipamento bélico quando em patrulha no terreno.

Dizia-me ele:

Há aqui alguma coisa que falha. Sou operador de transmissões de infantaria (radiotelefonista) e sou colocado numa companhia de artilharia. Vou para o mato só com o radio às costas, G3 “cá tem”. Enquanto tu tens no teu “escritório” duas armas no armeiro não utilizadas.


Já desmobilizados era comum nas conversas que tínhamos por telefone, e não só, estar quase sempre presente as lutas dos operários vidreiros por melhores condições de vida, surpreendendo-me uma vez:


Em minha casa, de volta de um frango assado, bem acompanhados, frisou: 

Não sou natural de Lisboa como tu, mas gosto de fado! 

Pena tenho que não saber cantar mas declamar talvez. 

Cá vai uma parte:


Olhai para estas mãos que aqui vedes

Já foram pequeninas e formosas

Leves e macias como lírios

Rosadas e frescas como rosas

Mãos vidreiras que o gás do forno queimou

Mãos vidreiras que o trabalho calejou

Mãos vidreiras que só fazem obras de arte

Mãos que sabem ser vidreiras

Honradas em toda a parte

Mãos que se irmanam com o fogo

Trabalhando o vidro em ebulição

Mãos que são a alma de um povo

Na sua dura vida e duro pão


Descansa em paz camarada 

Raul Pica Sinos

Agosto de 2020





Notas:: Na estante museu da minha casa tenho uma garrafa em cristal, com o meu apelido, que o Vítor Barros me ofertou. Esta garrafa, cheia de ginja feita pela Dª. Maria de Jesus sua mulher, já também defunta, simboliza os operários vidreiros. São ofertadas no museu do vidro na Marinha Grande a gentes de cariz importante quando na visita à cidade. É também religiosamente guardada a flor rosa em vidro que recentemente ofertou à Maria Emília, minha mulher.

Obrigado Vítor, 

Os versos são da autoria de Francisco Correia Moita

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