"Bom trabalho da Mariana Leal.
É de admirar e louvar o interesse de jovens, mais
propriamente de uma jovem, por um pedaço triste da nossa história, que durante
pelo menos trinta anos esteve esquecido. Os treze anos da guerra, e o pós
revolução, com o grande drama acrescido que foi a inevitável descolonização (o
filme refere os países ex-colonialistas em África).
Nunca consegui compreender o porquê de um país tão pequeno –
p. ex. 14 vezes menor que Angola – que teimava obstinadamente em não arranjar
solução política para o conflito, mesmo com abalizadas opiniões nacionais e
internacionais no contrário.
Este doloroso drama do nosso ultramar, bem escondido (não
havia guerra, as NT limitavam-se a fazer policiamento) foi alimentando pequenos
(ou grandes) ódios: Os portugueses das colónias não suportavam com agrado os
militares, por vezes com razões para isso, e os militares não suportavam
comportamentos e situações graves de certos apoios logísticos reais e escondidos, de fazendeiros do interior, às forças dos movimentos nacionalistas de guerrilha.
Os civis viam de certa maneira, nos militares intrusos
destabilizadores da antiga ordem estabelecida, e era corrente que as filhas dos
colonos brancos, serem instruídas, para que só deveriam “ter olhos” para os
militares oficiais??!!
Verdade seja dita, que o isolamento, as privações, os medos,
as saudades...tudo isto levava por vezes a refúgios no alcool que não raras
vezes levavam as tristes episódios.
Não era por acaso que no quartel muitas vezes faltam frescos
(legumes) e outros alimentos, mas não me lembro de falta de tabaco e
cerveja!!...
Já dizia alguém: Se na guerra faltasse bebida e droga a
guerra seria outra...
No entanto estes ódios renasceram e tudo se agravou, aquando
do regresso a Portugal de milhares de pessoas. Muitas injustiças aconteceram de
parte a parte!!
É fácil calcular como se sentiriam aquelas famílias,
despojadas de tudo para que tinham trabalhado uma vida inteira. Basta imaginar
e tentar mentalmente inverter a situação.
Numa retrospeção, poderemos perguntar: que ficou de todo este
drama??
A resposta é evidente e igual a todos os outros dramas
idênticos, passados e dos nossos dias...muita dor e sofrimento e milhares de
mortos e estropiados que pela lei natural das coisas vão desaparecendo, até
mais ninguém, a não ser os historiadores, se lembrar.
Gostei, passados 40 anos voltar a ouvir as vozes de dois
camaradas de quem lembro muito bem: o “pintassilgo” que em parceria com o
Contige, lá nos arranjavam “umas côdeas” para os petiscos.
O camarada Leal, do grande Pelotão Daimler. Bastante
admirava este pelotão, sempre os primeiros a sair, estrada fora, no começo dos
ataques, e que está ligado a um episódio comigo, numa noite de mais um ataque
ao quartel, em que saímos porta de armas fora, eu como atirador de
“desenrascanço” agarrado á velha metralhadora Dreyse, o condutor a mandar-me
disparar, eu numa atrapalhação total, sem conseguir encaixar o carregador na
arma, e finalmente os invólucros dos disparos em brasa a caírem na cabeça do
condutor (que pena já não lembrar o nome) ele aos gritos, pois não tinha posto
o capacete de aço...
Episódio que ficará para sempre na minha memória e que já
tive oportunidade de “postar” num dos meus escritos no Blog do BART.
Renovo os meus parabéns à jovem Mariana Leal, por este
documento.
Muito sucesso profissional e familiar para si.
Tudo de bom para todos.
José Justo"
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