domingo, 4 de outubro de 2015

OPERAÇÃO MAR VERDE - COM RELATOS DE ELEMENTOS DO IN.



FUTURO A Guiné-Bissau tem um passado, mas devido à instabilidade política não consegue sonhar com o amanhã
 
Companheiros
Conforme prometido, publicamos hoje mais um artigo sobre a Guiné-Bissau, desta vez sobre a famosa opareção MAR VERDE, que libertou da prisão os nossos companheiros, entre outros, que tinham sido capturados em Bissássema, na noite de 2 para 3 de Fevereiro de 1968, de triste memória.
Sobre este assunto existe um livro escrito pelo alferes Rosa da CART 1743 e que nos elucida sobre o sucedido, desde a captura até à libertação e tempos imediatos. 



Este artigo insere-se numa reportagem dos Jornalistas do Jornal Expresso, Luis Pedro Nunes e Fotografo Alfredo Cunha, a quem agradecemos a partilha.




DO “MAR VERDE”

ATÉ CUBA



22 DE NOVEMBRO DE 1970, GUINÉ-CONACRI



Deverá ser uma das operações militares mais conhecidas na Guiné. Pela sua espectacularidade. O então capitão-tenente Alpoim Calvão levou 400 homens, entre comandos africanos e opositores ao regime de Sékou Touré, para atacar a capital da Guiné-Conacri. No final, a maioria dos objectivos falhou — 0 regime não foi deposto, Amílcar Ca¬bral não foi capturado, os MIG não foram destruídos. Apenas os prisioneiros portugueses do PAIGC foram libertados. Nas Nações Unidas os problemas de Portugal — que negou o envolvimento na missão — agudizaram-se. Hoje culpa-se a PIDE pela má informação (e é capaz de ser verdade).
Abulai Djao é um homem fino e elegante. Já sabíamos, de uma viagem anterior, que era professor. Mas tinha sido aquela frase, “na guerra estive a pescar em São Tomé”, juntamente com “tive tuna discussão séria com o Alpoim Calvão em mar alto”, que nos tinha intrigado. Djao, aos 18 anos, no final do Liceu, acabou recrutado para uma tropa especial e foi levado para um treino militar, no qual foi “torturado” até estar pronto para se tornar um operacional. A força a que pertencia tinha outro nome pomposo. Mas se procuramos nos livros o nome correto será Flechas, forças especiais da PIDE formadas por africanos e que tinham como missão a recolha de informação com vista a operações de contraguerrilha. Djao só lá esteve seis meses. Que mudaram a sua vida. “Foram seis meses a pescar em São Tomé”, repete. “Tivemos umas passeatas por Angola e Moçambique e depois aquilo do Alpoim. ” O grupo era composto por 19 operacionais, entre angolanos e moçambicanos, mas também dois açorianos, um madeirense e um natural do Porto. Para o mar alto foram cinco. Todos africanos. Como era a farda? “Era muito interessante, porque tinha espaço para tudo, preta, cheia de bolsos, era checa e tínhamos uma pistola Makarov. ”
“Chegados ao mar alto, Alpoim Calvão mandou-nos analisar o cenário e disse qualquer coisa como ‘meus merdas, têm dez minutos para olhar para isso’” (risos). “Era evidente que não podia funcionar. A informação era escassa e havia um erro crasso: bastava um soldado ficar ferido e não havia forma de desconectar Portugal da operação. E houve uma discussão, digamos, acesa.” Mesmo assim, Djao acha que a operação teve um sucesso relativo para Portugal, um objectivo psicológico: Conacri ficava a saber que não era invulnerável e que Portugal tinha impedido Cabral de proclamar uma independência iminente... “ Claro que diplomaticamente foi um desastre e politicamente foi nojento.”
Chegada a independência da Guiné, este pas­sado não foi fácil de apagar. A Guiné-Bissau destacou-se pela matança aos soldados nativos (nomeadamen­te de tropa especial) que serviram nas forças espe­ciais portuguesas. Djao era então director da escola em Bafatá. E o destino abriu-lhe uma janela que lhe terá salvo a vida. Concorreu a uma bolsa de estudo em Cuba. Na noite antes de partir, o temido Antó­nio Buscardini, o chefe da Segurança do Estado do tempo de Luís Cabral, chamou-o, era um homem que todos retratam como muito especial. A conver­sa foi tensa e cifrada. Djao dá a entender que o terá tentado recrutar. Ficou cinco anos em Cuba sem voltar à Guiné. Em 1980, quando regressou, tinha quase a certeza de que seria mais um dos que aca­bariam mal. A Segurança de Estado de Buscardini era um misto de PIDE com KGB. Certos amigos, já colocados dentro do aparelho do Estado, fizeram- -lhe alguns favores para que se safasse, dado que tinha salvo muita gente. A 14 de novembro de 1980, Buscardini suicida-se (ou é pulverizado por um tanque) durante o golpe de Nino Vieira, por se ter recusado render-se. Djao levou tempo a recompor- -se desta angústia. Casou-se tarde. Vive em Gabu (Nova Lamego). É professor. Tem uma família linda. É um homem calmo, culto, discreto e respeitado. Esta história es­tava encarcerada nele, pareceu-nos...

NOTA - PARA A SEMANA CONTAMOS PUBLICAR OUTRO ARTIGO DESTA INTERESSANTE REPORTAGEM E QUE FOCA O "MASSACRE NO PORTO DE PIDJIGUITI EM BISSAU, CONTADA PELOS INTERVENIENTES.

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