terça-feira, 2 de novembro de 2010

O regresso a Fulacunda, pelo Joaquim Caldeira

Muitos anos se passaram, desde a última vez que um elemento da minha companhia, C CAÇ 2314, se deslocou à Guiné para matar saudades.
Talvez ainda se lembram do ex-furriel Leite. Rapaz de constituição forte, açoriano de origem e residente na Ilha de são Miguel, reformado da banca, actualmente muito doente mas cheio de esperança. Foi o único militar da companhia condecorado com a cruz de guerra que, garbosamente recebeu das mãos do ainda Estado Novo. Foi uma condecoração merecida. Durante uma grande parte da campanha comandou um pelotão de voluntários, recrutados nos restantes pelotões e tinham como missão fazer o papel sujo da guerra. Cabia-lhes fazer o assalto para permitir a entrada da restante tropa nos objectivos inimigos. Também as missões de patrulhamento nocturno e emboscadas lhes estavam confiadas. Fizeram muitas apreensões de armamento e ronco que baste durante as incursões pela mata.
Mas voltemos à história. Sendo residente na ilha de São Miguel, Açores, não tinha deslocações fáceis ao continente devido aos dias para a viagem de vinda e regresso e estadia. Também os custos tinham que ser tidos em conta e, na altura tinha que trabalhar. Ainda assim, arranjou tempo para vir aos convívios que fui organizando e a sua presença era um a arma para eu esgrimir junto dos que, por comodidade, não compareciam.
E foi num desses convívios que contou:
Numa ocasião que lhe pareceu própria, deslocou-se à Guiné e fez questão de viajar entre Bissau, Tite e Fulacunda. E foi precisamente em Fulacunda, local onde permanecemos mais tempo e onde tivemos maior contacto com a população que, à chegada, deu de caras com uma cara conhecida. Era a Binta. Também ela o reconheceu. Conversaram por algum tempo e foi um desfiar de lamentações. Até que, a certa altura da conversa ela lhe perguntou: Quando é que a independência acaba e vocês regressam?
Esta pergunta teve a resposta que pareceu adequada e não terá deixado satisfeita a interlocutora. O Leite ficou comovido.
Também eu, ao ouvir, não pude ficar indiferente a este lamento próprio de quem está cansado de sofrer sem vislumbrar uma luz que alumie o fim do túnel.
Até quando?
Gostaria que esta história fosse publicada no Blogue do BART 1914 a quem a endereço para essa finalidade. Aos camaradas com quem convivi, o meu abraço.
Joaquim Caldeira

1 comentário:

  1. Aquele abraço.
    Continua com as tuas bem conseguidas histórias, que aprecio e vou seguindo no vosso blogue (da CCAÇ2314).
    Hip.

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