sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Nova Sintra - 100 metros quadrados de horror! 2/2


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2/2 – 100 METROS QUADRADOS DE HORROR,
FECHADOS POR ARAME FARPADO
Enfraquecida a acção da guerrilha na zona, resolvidos os problemas das acessibilidades e escolhido o local, agora o objectivo estava virado para a construção do aquartelamento em Nova Sintra.
Na manhã do dia 6 de Maio de 1968 parte de S. João a C. Caç. 1802, com 17 viaturas. Chega ao local para o novo aquartelamento cerca das 15 horas do mesmo dia. Já ali se encontravam as NT, saídas de Tite. Nenhuma destas duas forças militares, nos itinerários então percorridos, teve contacto com o IN.
Havia a noção geral que a guerrilha jamais aceitaria a construção de um novo aquartelamento numa zona que sempre dominara. Todos tinham a noção que o IN voltaria a reunir forças para retomar a actividade e procurar repor o prestígio que gozava naquela região. Sabíamos do seu grande enfraquecimento, abalado pelas perdas bélicas e humanas, sobretudo desde a sua neutralização em Bissássema. Mas também se sabia que os seus recursos estavam longe de esgotados. Impunha-se começar os trabalhos na instalação do aquartelamento e proporcionar, com o feito, a melhor segurança para a defesa dos objectivos e das NT.
Despejadas as viaturas, os trabalhos iniciaram-se a ritmo acelerado. Isolou-se o perímetro com o arame farpado, construíram-se valas-abrigos, a norte e a nascente, talvez com 2 metros de largo e 5 metros de comprimento e as latrinas. Deu-se começo às fundações para os futuros pavilhões e postos de guarnição para a defesa das posições. Começou-se também a limpar terreno com vistas a abertura da pista de aterragem.
Conta-me o ex-Furriel Domingos Monteiro, que
as moscas e os mosquitos eram “personagens” deveras e muito incomodativas de dia. Á noite faziam desesperar com as sucessivas picadas, nem mesmo roupa que trazíamos vestida as conseguia travar!
Acrescentando que …
As horas que contava, na escuridão daquela selva, mais pareciam dias. As chuvas também estiveram presentes, quando, passados 2 dias de medos e incertezas, pela calada da noite, o perímetro de terra e lama onde as NT se aquartelavam, com cerca de 100 m2, é atacado, em força, por cerca de 100 homens, bem armados e municiados mas prontamente repelidos com pesadas baixas!
Pelas manhãs e durante o dia os trabalhos continuavam. Patrulham-se estradas e caminhos, aqui ali rastos de sangue e material bélico ligeiro deixado para trás. A cozinha de campanha enquanto não fez fumo, os alimentos eram das rações de combate, que sempre transportávamos. Na água que bebíamos colocávamos comprimidos para evitar as diarreias e febres. Um dado dia foram distribuídas 2 cervejas a cada militar, até nisto tive azar, porque ainda hoje não gosto desta bebida!
Por sua vez o Carlos Leite (Reguila) refere
Na sucessão dos dias tudo era igual, o trabalho com as pás e com as picaretas calejava-me as mãos, o medo era constante, mas a disposição para a luta sobreponha-o. O cantarolar da passarada não nos parecia ter o mesmo encanto. No terreno lamacento, alguns sapos, eram “sticados” pela pá ou com a picareta, aqui ali ouvia-se o ladrar de um cão. Pelas noites dentro o sofrimento era maior, o vento ora forte ora brando, fazia-me confundir o “som” da selva. Eram nestes momentos que a falta da família e dos meus amigos mais se sentia. Ouvia as flagelações do IN a outros aquartelamentos e questionava-me – quando será a nossa vez?
O aquartelamento de Nova Sintra, durante o mês de Maio, foi flagelado 7 vezes, causando 1 morto (a 13/05) e 19 feridos graves que, muitos destes, foram evacuados, nessas mesmas noites, por helicópteros directamente para Bissau. Do lado contrário as mortes confirmadas foram em número de 26 e feridos 31.
A 05/06/68 o aquartelamento de Nova Sinta foi visitado pelo CMDTChefe acompanhado pelo CMDT do Bart. A 11/07/68 foi inaugurada a iluminação exterior e, a 19/07/68 assim como a pista de aterragem por uma avioneta, um Dornier 27.
A luta, essa, estupidamente tinha que continuar, causando continuadamente mortes e feridos de ambos os lados, estragos e desgraças bem ao gosto daqueles que as fomentam.
Pica Sinos
Nota:
As fotos são do museu do Jordão Justo

5 comentários:

  1. Relembras aqui tanta coisa passada em dias e horas verdadeiramente complicados.
    Pena que alguns dos intervenientes não venham ao blog descrever a sua participação nestes dois casos de guerra - Bissassema e Nova Sintra.
    Mas é bom ler tudo isto que descreves com muita minucia.
    Um abraço.
    Bem hajas!
    Leandro Guedes

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  2. Amigo Leandro

    grandes tormentos que passaram, um grande abraço.



    FGVieira

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  3. A memória dos homens é curta.
    Lastimo a Vossa falta de memória
    para com a C. Cac 2314 que viveu convosco Bissassema e abriu as operações de Nova Sintra.
    De todos vos guardo boa recordação.
    Se não fosse a boa camaradagem tudo teria sido mais dificil.
    Um grande abraço e votosde felicidades para todos
    Fernando de Almeida

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  4. Artur Capela Gomes Soldado no 3365/67
    gostaria de corrigir apenas um pequeno erro no comentário que li sobre Nova Sintra a companhia que chegou a Nova Sintra ida de São João não foi a Companhia de Caçadores 1802 mas sim A companhia de artilharia ligeira 1802 da qual eu fazia parte como condutor da Mercedes o Capela.
    com um grande abraço para toda a rapaziada da companhia de engenharia do batalhão 1914.

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  5. Certamente que é por engano que está referido que o aquartelamento de Nova Sintra tinha 100 metros quadrados. Na realidade era um quase quadrado com cerca de 100 metros de lado.

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